ETANOL DE SEGUNDA GERAÇÃO, UMA SOLUÇÃO SUSTENTÁVEL NO CRESCIMENTO DA MATRIZ ENERGÉTICA DE BIOCOMBUSTÍVEIS
Daniel Roberto Madureira da Silva
Graduando Tecnologia de Gestão Ambiental - UNISALESIANO1
Técnico em Agroindústria com Ênfase em Açúcar e Álcool - IAL2
Técnico de Segurança do Trabalho - SENAC3
E-mail: daniel.madureira@globo.com
RESUMO
Este trabalho objetiva mostrar o caminho que os maiores produtores de biocombustíveis buscam para aumentar a capacidade da matriz energética. O etanol, fonte limpa e renovável, deverá suprir uma fatia generosa perante o consumo de combustíveis fósseis. Pesquisas de tecnologias limpas para extração do etanol celulósico destaca o Brasil como um dos pioneiros na busca pela otimização industrial e comercial do processo. Nesse sentido, se destaca no cenário mundial, de forma plausível na produção de biocombustíveis, pois, possui características continentais, tecnológicas e climatológicas, permitindo exportar tecnologia renovável e contribuir ativamente na economia do país.
Palavras chave: Biocombustíveis, etanol celulósico, energia renovável, matriz energética.
ABSTRACT
This paper aims to show the way that the largest producers of biofuels seek to increase the capacity of energy. Ethanol, clean and renewable source, must meet a generous share to the consumption of fossil fuels. Searches of clean technologies for the extraction of cellulosic ethanol, Brazil stands out as one of the pioneers in the search for the optimization of the industrial and commercial process. In this sense, stands out on the world stage, plausibly in the production of biofuels, therefore, has continental characteristics, technological and climate, allowing export renewable technology and contribute actively to the economy.
Keywords: biofuels, cellulosic ethanol, renewable energy, energy matrix
1. INTRODUÇÃO
Os estudos sobre as necessidades de aumento na produção da matriz energética mostram que o desenvolvimento deve ser baseado na sustentabilidade de fontes de energia limpa e renovável, difundindo o potencial energético ainda a ser desenvolvido, em especial nos países com características continentais, tecnológicas e climatológicas, como é caso do Brasil.
Os combustíveis fósseis ainda são responsáveis por 75% da energia consumida no mundo. Em 2009, na União Europeia, 62% da capacidade de energia instalada já era produto de fontes renováveis (GORDINHO, 2010).
Esses combustíveis que permitem a existência dos meios de transporte rápidos e eficientes que temos hoje, bem como boa parte das atividades industriais. Lamentavelmente, eles não vão durar mais do que algumas décadas. Gordinho (2010) relata que os combustíveis fósseis, têm suas reservas finitas, a segurança de abastecimento é problemática para os muitos países que os importam e o seu uso é a principal fonte dos gases que estão provocando mudanças climáticas e o aquecimento global. O Brasil tem uma situação peculiar e mais de 46% da energia vêm de fontes sustentáveis, das quais 38% são derivados da cana-de-açúcar. Isso demonstra tão quanto é necessário desenvolver e aperfeiçoar tecnologias limpas e renováveis.
No Brasil, nesta década, (SOUSA, et al., 2010) relatam que a participação do petróleo e derivados, diminuiu cerca de nove pontos percentuais: passou de 45,5% em 2000 para 37,3% em 2008. Ao fim desse período, mais de 16% da energia consumida no país já provinha de derivados da cana-de-açúcar, ultrapassando a energia hidráulica em importância na matriz e assumindo o segundo lugar. A matriz energética brasileira, que se destaca pela grande incidência de fontes renováveis, passou por transformações que a colocaram entre as mais limpas do mundo, alcançando patamares ambientais respeitados mundialmente.
Com a venda de carros Flex 4 girando em torno de 8 milhões de carros vendidos desde 2003, é o ápice do sucesso do etanol brasileiro e um dos protagonistas, porém esta história não acabou e muitas coisas podem e devem ser melhoradas, com ganhos na eficiência energética e desempenho ambiental. Para agregar ainda mais vantagens ao uso do etanol, em 2009 foi lançada a primeira moto flex, atendendo as expectativas esperadas, pois foi desenvolvida e equipada com injeção eletrônica e conversor catalítico. A versão flex atende plenamente aos limites de emissão vigentes no país e no exterior (ÚNICA, 2009).
O etanol, produzido da cana-de-açúcar, já substitui hoje metade da gasolina que seria consumida e seu custo é competitivo sem os subsídios que viabilizaram o programa no seu início. A solução brasileira para os problemas dos combustíveis fósseis é o uso do etanol de cana-de-açúcar para substituir a gasolina. O mercado aposta no etanol e o uso deste combustível não é exclusividade brasileira e está sendo adotado em outros países produtores de cana-de-açúcar. Além da significativa expansão das plantas tradicionais, diversas unidades entraram em operação nos últimos anos, totalizando investimentos bilionários.
É preciso, pois, encontrar substitutos para esses combustíveis. Nada mais racional do que produzi-los com base em matéria orgânica renovável (biomassa), da qual, no passado distante, os combustíveis fósseis foram produzidos pela natureza.
Existem discussões e diversas pesquisas de tecnologias de segunda geração, para a produção de etanol com base na celulose, o chamado “etanol de segunda geração”, que é produzido a partir da celulose, matéria prima abundante, presente nos resíduos da cana-de-açúcar e em outras matérias-primas vegetais.
Alternativa fundamental para produzir o combustível renovável sem prejudicar a produção de alimentos, além de ser uma opção para o uso energético da biomassa, podendo ser obtido a partir da tecnologia de lignocelulose, utilizando-se o bagaço e a palha da cana, com vantagens ambientais e econômicas.
Esta obra apresenta as características desse biocombustível e de sua agroindústria, com ênfase na experiência brasileira e, em alguns casos, cotejando com outras tecnologias bioenergéticas.
2. ETANOL DE SEGUNDA GERAÇÃO
O Brasil visualiza a possibilidade de vir a ser um grande exportador de petróleo, em razão da recente descoberta das jazidas do pré sal. Essa descoberta desvenda um potencial que levará pelo menos uma década para se realizar, e nada impede que o Brasil seja autossuficiente em petróleo, exporte etanol e construa uma matriz energética que valorize as bioenergias.
Não existe apenas uma solução energética melhor para todos, como foi postulado no século XX (RODRIGUES, 2003). Existem aproveitamentos regionais mais ou menos adequados às localidades. De qualquer forma, os biocombustíveis chegaram para ficar, têm seu lugar e vão promover mudanças consideráveis.
“A agroenergia não é como comida, que você produz em qualquer país do mundo. Ela é uma equação com três variáveis: a terra, com tudo o que ela tem (água e nutrientes), a planta e o sol. Agroenergia é uma equação de fotossíntese, tem que ter sol. Onde tem sol o ano inteiro? Entre os dois trópicos, de Câncer e de Capricórnio. Quem está nessa faixa? A América Latina, a África Subsaariana e a Ásia mais pobre.” (RODRIGUES, 2003, apud GORDINHO, 2010, p. 133).
Baseado nos aspectos apresentados (RODRIGUES, 2003), o Brasil atende a todos os elencados, podendo produzir brevemente o etanol de segunda geração, em escala industrial. O etanol de lignocelulose é um combustível renovável, produzido a partir de resíduos agroindustriais, como o bagaço e a palha da cana.
A grande disponibilidade de matéria-prima e o baixo custo, em relação a outros países, criam uma vantagem competitiva ao Brasil, pois a possibilidade de uso do bagaço e da palha da cana no processo produtivo de bioetanol é um fato que destaca mais uma vez o país, no cenário mundial, perante seus concorrentes. Isso tem despertado o investimento de diversos grupos internacionais, interessados em produzir etanol de segunda geração.
A perspectiva é que esses processos possam ser interligados à estrutura existente nas unidades produtoras brasileiras, compartilhando tudo o que for possível para viabilizar uma operação custo efetiva. Com a gradual queima da palha da cana, esse material poderá ser utilizado como matéria-prima nos novos processos.
Além disso, a tendência de substituição das caldeiras antigas por outras, mais eficientes, e de uso de caldeiras de alto desempenho, deverá resultar em excedentes de bagaço que, juntamente com a palha, poderão ser transformados em etanol de segunda geração.
Figura 1 Estrutura típica da biomassa da cana
Fonte: Seabra (2008)
2.1. TECNOLOGIAS DISPONÍVEIS
Com exceção da cana, as tecnologias comercialmente disponíveis na atualidade para a produção de bioetanol são por meio do amido e de açúcares, como no caso do milho e da beterraba, envolvendo ganhos energéticos e ambientais bastante estreitos. Além disso, essas matérias-primas apresentam uma limitada vantagem econômica e encontram, em geral, mercados alternativos mais remuneradores, como alimentos ou insumos para outros fins.
Entretanto, apesar de suas destacadas vantagens, a cana-de-açúcar não é uma opção viável para todas as regiões do planeta, por esse motivo, os países do hemisfério Norte, vêm procurando incessantemente rotas tecnológicas que permitam a produção de um bicombustível eficiente, tanto do ponto de vista ambiental quanto do ponto de vista econômico.
O bioetanol vem sendo produzido pela hidrólise e, ou fermentação de materiais lignocelulósicos desde o fim do século XIX (GOLDEMBERG; NIGRO; COELHO, 2008, p. 111), mas somente nos últimos 20 anos essa tecnologia tem sido proposta para atender o mercado de combustíveis.
Analisando as informações pode-se firmar a idéia de que a ampliação da matriz energética, predominando atualmente o conceito para o futuro próximo, a tecnologia de produção de bioetanol por meio da hidrólise de materiais celulósicos venha a representar essa sonhada alternativa.
2.2. HIDRÓLISE DE MATERIAIS LIGNOCELULÓSICOS
As tecnologias para a obtenção de bioetanol com base em materiais lignocelulósicos envolvem a hidrólise dos polissacarídeos da biomassa em açúcares fermentescíveis e sua posterior fermentação para a produção do etanol. Para executar essa tarefa, a hidrólise utiliza tecnologias complexas e multifásicas, com base no uso de rotas ácidas e/ou enzimáticas para a separação dos açúcares e remoção da lignina (BNDES & CGEE, 2008).
Figura 2 Esquema do processo de produção de etanol por meio da hidrólise da biomassa.
Fonte: SEABRA (2008).
A biomassa lignocelulósica é composta por polissacarídeos (celulose5 e hemicelulose6) e pela lignina7, polímero complexo de grupos metoxi e fenilpropânicos, que mantém as células unidas. A fração celulósica (40%-60% da matéria seca) é um polímero linear do dímero, glicose-glicose (celobiose), rígido e difícil de ser quebrado; sua hidrólise8 gera glicose9, um açúcar de seis carbonos, cuja fermentação com Saccharomyces cerevisiae10 já é bem conhecida. Por sua vez, a fração hemicelulósica (20%-40%), em geral, é constituída de uma cadeia principal de xilose (ligações β-1,4) com várias ramificações de manose, arabinose, galactose, ácido glicurônico etc (BNDES & CGEE, 2008).
Figura 3 Estrutura celulósica (Wikipédia)
Figura 4 Composição Básica (Wikipédia)
A hemicelulose é muito mais fácil de ser hidrolisada do que a celulose, mas a fermentação dos açúcares de cinco carbonos (pentoses) ainda não é tão desenvolvida quanto os processos envolvendo a glicose Já a estrutura bioquímica da fração de lignina (10%-25%) não está relacionada a moléculas simples de açúcar, não sendo pretendida, para a produção de bioetanol por rotas fermentativas, no entanto, desempenha um papel fundamental para o sucesso da tecnologia de hidrólise (BNDES & CGEE, 2008).
É possível produzir diversos produtos com base na lignina, atualmente o foco dos estudos tem se voltado para o uso desse material como fonte de energia para os processos, o que garantiria a auto-suficiência e, eventualmente, até a possibilidade de exportar energia elétrica excedente tornando essa situação positiva tanto para a viabilidade econômica da tecnologia quanto para os quesitos ambientais, já que reduziria a dependência por recursos energéticos fósseis externos.
De forma geral, a primeira etapa do processo consiste no pré-tratamento mecânico da matéria-prima, que visa à limpeza e a quebra do material, a fim de causar a destruição da sua estrutura celular e torná-la mais acessível aos tratamentos químicos ou biológicos posteriores. A etapa seguinte consiste na remoção da lignina e na hidrólise da hemicelulose, que também pode ser denominada pré-tratamento (BNDES & CGEE, 2008).
2.3. PROCESSO DE PRÉ-TRATAMENTO DA BIOMASSA
Conforme fomentado na literatura (BNDES & CGEE, 2008), na etapa de hidrólise propriamente dita, a celulose é convertida em glicose, segundo a seguinte reação, que pode ser catalisada por ácido diluído, ácido concentrado ou enzimas (celulase):
n C6H10O5 + n H2O → C6H12O6
Figura 5 Celulose (Wikipédia)
Figura 6 Celulose e Glicose (Wikipédia)
A hidrólise ácida (tanto concentrada quanto diluída) ocorre em dois estágios para aproveitar as diferenças entre a hemicelulose e a celulose, no primeiro envolve a hidrólise da hemicelulose, conduzida conforme as condições do pré-tratamento, no segundo estágio, temperaturas mais altas são aplicadas, buscando a otimização da hidrólise da fração celulósica.
O processo com ácido diluído utiliza altas temperaturas e pressões com tempos de reação de segundos a alguns minutos, o que facilita o uso de processos contínuos, porém os processos com ácido concentrado são conduzidos em condições mais brandas, mas com tempos de reação tipicamente mais longos.
No processo enzimático, a hidrólise é catalisada por enzimas chamadas genericamente de celulases; na realidade, trata-se de um complexo enzimático composto por endoglucanases (que atacam as cadeias de celulose para produzir polissacarídeos de menor comprimento), exoglucanases (que atacam os terminais não redutores dessas cadeias mais curtas e removem a celobiose) e β-glucosidases (que hidrolisam a celobiose e outros oligômeros à glicose). Assim como nos processos ácidos, existe a necessidade de um pré-tratamento para expor a celulose ao ataque das enzimas.
Como o processo enzimático é conduzido em condições brandas (pH 4,8 e temperatura entre 45° e 50° C), o custo de utilidades é relativamente baixo, além de permitir maiores rendimentos, possibilitar a fermentação simultânea à sacarificação e apresentar baixo custo de manutenção (não há problema de corrosão). Por conta de seu grande potencial de evolução e redução de custos, muitos especialistas vêem a hidrólise enzimática como a chave para a produção de bioetanol a um custo competitivo no longo prazo.
Comparativamente, tem-se a hidrólise com ácido diluído num estágio mais avançado do que as demais, mas com graves limites de rendimento (50%-70%). A hidrólise com ácido concentrado apresenta rendimentos maiores e menores problemas com a produção de inibidores, embora a necessidade de recuperação do ácido e de equipamentos resistentes à corrosão comprometa o desempenho econômico do processo.
A hidrólise enzimática, por sua vez, já apresenta altos rendimentos (75%-85%), e grandes melhorias ainda são esperadas (85% - 95%), além disso, a não utilização de ácidos pode representar grandes vantagens não só econômicas (equipamentos com materiais mais baratos e menor custo operacional), como também ambientais (não há produção de resíduos) (BNDES & CGEE, 2008).
De acordo com as pesquisas na maioria dos casos, esses processos ainda estão em estágios iniciais de desenvolvimento, com experimentos conduzidos em volumes reduzidos, para os sistemas reais, com grandes volumes, os rendimentos deverão ser naturalmente menores.
3. DESAFIOS PARA A PRODUÇÃO DE ETANOL LIGNOCELILÓSICO
3.1. FONTES DE BIOMASSA – CANA DE AÇÚCAR
A indústria brasileira de etanol é baseada hoje no caldo de cana de açúcar, que contém somente 1/3 da energia da planta, os outros 2/3 estão no bagaço, metade do qual é queimado para produzir energia e na palha da cana geralmente queimada ou deixada no campo, que poderiam servir como fonte de celulose.
Uma destilaria que produz atualmente 1 milhão de litros de etanol/dia extraído do caldo da cana poderia produzir um adicional de 150 mil litros de etanol do bagaço com a atual tecnologia (MARQUES, 2009). As estimativas para 2025 é que esse montante possa chegar a 400 mil litros, porém esse aumento dependerá dos novos avanços científicos e tecnológicos incorporados aos processos de hidrólise da celulose para obtenção do etanol (ÚNICA, 2009).
Considerando o avanço tecnológico previsto, a produção aumentaria consideravelmente contribuindo para a otimização dos processos já existentes nas destilarias, pois o bagaço que é queimado atualmente nas caldeiras e vendido quando excedente, seria transformado em etanol, sem necessidade de expandir áreas plantadas.
3.2. DESENVOLVIMENTO DE PROCESSOS - PLANTAS PILOTOS
A hidrólise da biomassa é um processo extremamente complexo e necessita uma melhor compreensão, especialmente quando sua ocorrência se dá em grande escala, grande parte dos processos de hidrólise de cana envolve operações bifásicas em sistema sólido-líquido, o que aumenta sua complexidade e dificulta o escalonamento.
No Brasil a maioria dos projetos desenvolvidos, é realizada em pesquisas ou para um melhor entendimento em escala laboratorial, não garantindo a produtividade em escala industrial.
A tecnologia de hidrólise também tem sido desenvolvida, com pesquisas aplicadas em um estágio avançado. Há alguns anos, em um projeto envolvendo a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e o Centro de Tecnologia Canavieira (CTC), a indústria Dedini trabalha desde 2002 com uma planta piloto na Usina São Luiz na cidade de Pirassununga interior de São Paulo, aonde vem testando em escala-piloto um processo para a produção de bioetanol com base no bagaço e, eventualmente, palha de cana, e atualmente a planta opera com uma produção de 5 mil litros de etanol por dia (ELENO, 2007).
A maior empresa de extração de petróleo do Brasil não poderia ficar de fora, a Petrobras tomou a iniciativa de instalar no CENPES, seu Centro de Pesquisas no Rio de Janeiro, um reator para hidrólise enzimática e, por iniciativa do Ministério de Ciência e Tecnologia, outra plataforma para hidrólise enzimática de bagaço de cana em escala-piloto está sendo implementada em Campinas (SP) junto ao recém-criado Centro de Ciência e Tecnologia do Bioetanol. Essa plataforma dá seqüência a um projeto em escala de laboratório, envolvendo 20 unidades de pesquisa no Brasil com parcerias no exterior e uma centena de pesquisadores de universidades e centros de pesquisa brasileira (BNDES & CGEE, 2008).
3.3. DESENVOLVIMENTOS DE PROCESSOS
Uma planta piloto busca dentre seus vários objetivos aperfeiçoar o processo em escala produtiva para isso depende basicamente (ELENO, 2007).
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ampliar a escala dos processos físicos, químicos e biológicos relacionados à produção de bioetanol pela rota da hidrólise enzimática;
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definir em escala piloto o processo de conversão de bagaço e palha de cana-de-açúcar em bioetanol;
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validar os resultados experimentais obtidos em escala de bancada;
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realizar balanços de massa e energia e obtenção de dados das cinéticas dos processos em escala piloto;
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avaliar os requisitos de materiais de construção dos equipamentos;
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aquisição de dados para projetos conceituais de equipamentos;
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otimização do processo.
3.4. MÓDULOS DE UMA PLANTA PILOTO
De acordo com o Centro de Ciências e Tecnologia do Bioetanol (CTBE) acredita-se que somente uma tecnologia comercialmente viável de transformação de biomassa lignocelulósica em etanol promete uma série de ganhos ao setor, pois só a hidrólise do bagaço de cana-de-açúcar, por exemplo, poderá aumentar a produtividade de conversão desta em bioetanol em 40%, em relação aos padrões atuais de fermentação do caldo, isto significa um incremento produtivo que traz consigo uma importante redução do impacto ambiental causado pela indústria canavieira.
Vale ressaltar que as principais pesquisas desenvolvidas nos projetos de planta piloto é tratar o desenvolvimento de rotas economicamente viáveis em áreas críticas da tecnologia de hidrólise e essas áreas abordam o pré-tratamento físico e termoquímico do material lignocelulósica, a produção de enzimas, a separação e recuperação da lignina e a fermentação de pentoses (MARQUES, 2009).
Por fim, uma planta piloto permite o desenvolvimento de estudos paramétricos, a fim de avaliar o desempenho técnico-econômico e ambiental de processos.
4. PERSPECTIVAS PARA O ETANOL CELULÓSICO PARA O BRASIL
As estatísticas mostram que atualmente são produzidos no Brasil aproximadamente cerca de 20 bilhões de litros de etanol por ano, sendo que as expectativas baseadas nas pesquisas de produção apontam uma produção de 200 bilhões até o ano de 2025 com o aumento produtivo do etanol de segunda geração (GORDINHO, 2010).
Para atingir a meta de 200 bilhões de litros por ano, a produção de etanol combustível, que hoje está mais focada no Centro-Sul do Brasil, seria estendida para outras regiões, como Norte e Nordeste. Com isso, o país teria condições de suprir parte do mercado internacional de etanol, podendo substituir de 5% a 10% da gasolina utilizada atualmente no mundo. Em 2002, o mercado mundial desse combustível derivado do petróleo, foi cerca de 1,17 trilhão de litros, sendo que se o Brasil produzir 150 bilhões de litros de etanol poderá suprir a demanda de 10% desse mercado.
Existem hoje no Brasil 433 usinas em operação, destas 83 na região Norte/Nordeste e 350 na região Centro/Sul (GORDINHO, 2010).
Os cinco maiores grupos econômicos da região Centro Sul do Brasil responderam por 24% da moagem regional e por cerca de 20% de toda a cana moída no país e 22% da moagem de cana de açúcar ocorreu em empresas com participação ou controle de mercado externo (ÚNICA, 2009). Os dados mostram como empresários estrangeiros estão investindo pesado na agroindústria sucroalcooleira.
Na vertente ambientalista, além de substituir parte do petróleo, o etanol tem a seu favor o fato de que não contribui para o efeito estufa, porque o dióxido de carbono, principal gás desse fenômeno, liberado pela combustão do álcool, em um ano é reabsorvido pelas plantas na safra seguinte.
4.1. BRASIL X ESTADOS UNIDOS
Os Estados Unidos estão apostando na rota de transformação da celulose em etanol, lá se extrai o álcool do sabugo e da palha de milho, resíduos descartados do aproveitamento do grão usado para obtenção de etanol, além de outros resíduos agro-florestais (ESCOBAR, 2008).
Goldemberg (2009), afirma que ainda há muito espaço para crescer com a atual tecnologia e explicou que existe um movimento significativo nos Estados Unidos e na Europa a favor de investimentos na tecnologia de segunda geração, ou na busca pelo chamado etanol celulósico “Os americanos estão animadíssimos com a tecnologia de segunda geração, porque não tem cana-de-açúcar. Querem mostrar que a tecnologia atual não tem futuro. […] Há muita área no mundo que poderia aumentar a plantação de cana, assim como países que hoje praticamente só produzem açúcar, como África do Sul e Colômbia, que poderiam se voltar também para o etanol.” (GOLDEMBERG, JOSÉ, 2009 apud GORDINHO, 2010, p. 105).
Uma das diferenças entre a produção norte-americana e a brasileira, é que aqui o etanol de celulose vai agregar milhões ou bilhões de litros ao álcool, produzido da sacarose, que já é distribuído nos postos de combustíveis.
Figura 7 Estimativas de oferta e demanda de bioetanol combustível para 2010-2015.
Fonte: Modificado com base em Global Biofuels Center (2008).
Segundo Gordinho (2010), onde destaca outra diferença a favor do Brasil, o custo de produção do etanol entre os dois países, pois enquanto o etanol extraído do milho dos Estados Unidos fica em US$ 0,39 o litro, o do caldo de cana custa US$ 0,21. Até mesmo o Presidente do EUA durante uma parada no estado do Indiana/EUA em março de 2009, expôs sua opinião em referência ao etanol brasileiro.
“O etanol de milho não é o ideal. Eu sempre fui um defensor do etanol de milho. Eu vim de um estado que produz milho IIlinois. É uma boa ação para a transição, mas na verdade o etanol de milho não é tão eficiente quanto aos que os brasileiros estão produzindo de cana-de-açúcar, citou Barack Obama.” (Revista Ethanol Summit, 2009, p. 71).
A opinião do governante de uma das maiores potências do mundo, grande produtora de combustível e maior consumidor de combustíveis fósseis, os EUA, tem o mesmo foco da opinião do ex-presidente do Brasil.
“Além de limpo, nosso etanol tem uma produtividade excepcional. Para cada unidade de energia gasta na produção de etanol de cana-de-açúcar, são obtidas nada menos que 9,2 unidades de energia. Com o petróleo, a relação é de uma unidade gasta para 3,5 unidades de energia obtida. O menos produtivo é o etanol de milho, que, para cada unidade de energia consumida, produz apenas 1,3 unidades e só resiste por ser fortemente subsidiado, comentou Luiz Inácio Lula da Silva.” (Revista Ethanol Summit, 2009, p.7).
Conforme CENA – USP (2007) dominar as técnicas de quebra da molécula de celulose via processo enzimático ou químico fará a diferença num futuro próximo, e quem detiver esses domínios sairão na frente, porém, várias pesquisas que pareciam abstratas começam hoje a ser compreendidas e podem ser utilizadas dentro de outro contexto.
Figura 8 Custo de produção etanol
O domínio da tecnologia da hidrólise reduzirá os custos de produção do etanol celulósico e poderá tornar essa alternativa viável e em longo prazo, não se pode desprezar a possibilidade real de produção do etanol celulósico não somente de resíduos agro-florestais, mas de uma produção sustentável direcionada para essa finalidade.
5. BENEFÍCIOS AMBIENTAIS
Desde o momento que a cana brota no campo, vários benefícios são gerados ao meio ambiente, pois a planta absorve o gás carbônico, este um dos gases que provoca o efeito estufa que é gerado nas diversas etapas do processo de produção e consumo do etanol.
Para cada mil litros de etanol consumido e produzido são gerados cerca de 89% de CO a menos na atmosfera se comparado com a gasolina conforme observado na tabela abaixo, o que comprova que trocar o uso da gasolina que é um combustível fóssil e não renovável pelo uso do etanol é uma atitude totalmente benéfica e positiva ao Meio Ambiente (UNICA, 2009).
Considerando 50% de colheita manual e 50% de colheita mecanizada podemos considerar os seguintes índices de emissão de CO2.
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Cultivo e colheita - Tratores, colheitadeiras e insumos agrícolas emitem gás carbônico (CO2). A colheita manual precisa da queima da palha da cana, que também gera emissões. Emissão total: 2961 kg CO2
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Crescimento - A cana é uma “esponja” natural, que absorve grande volumes de CO2 enquanto cresce. Absorção: 7.650 kg CO2
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Processamento - A fermentação e a queima do bagaço para a geração de energia emitem CO2. Emissão: 3604 kg de CO2
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Bioeletricidade - O uso do bagaço para geração de eletricidade e energia excedente evita as emissões na atmosfera. Emissão evitada: 225 kg de CO2
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Transporte - O etanol é transportado para os postos de combustível em caminhões movidos a óleo diesel. Emissão: 50 kg de CO2
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Motor dos automóveis - A queima do etanol gera 1.520 kg de CO2
Figura 9 Círculo Virtuosos do etanol – emissão de CO2
Fonte: Do álcool ao etanol: trajetória única; pág. 72
No ciclo completo, a emissão de CO2 pelo etanol é menor que a da gasolina, onde são gerados 8.135 Kg de CO2, dentre estas 7875 Kg de CO2 são reabsorvidas e, ou evitadas, ou seja, um saldo de 260 Kg de CO2. Combustíveis fósseis como a gasolina, por exemplo, emite o equivalente a 2.280 Kg de CO2.
Em Gordinho (2010), a contribuição do etanol é vital para que o país reúna as condições necessárias para um desenvolvimento sustentável, com ganhos sociais, econômicos e ambientais, em um momento particularmente crucial para o planeta e seus habitantes.
Outra realização importante em direção à sustentabilidade foi o Protocolo Agroambiental do Setor Sucroalcooleiro, firmado em 2007 entre o estado de São Paulo e a ÚNICA (ÚNICA,2009). Entre as diretrizes estabelecidas, merece atenção especial o compromisso de antecipar os prazos legais para o fim da colheita da cana-de-açúcar com o uso prévio do fogo nas áreas cultivadas pelas usinas. Essa prática agrícola, denominada “queima controlada da palha da cana”, é necessária para a colheita manual, sem o emprego de máquinas. Até os primeiros meses de 2010, haviam aderido ao protocolo 171 unidades industriais e associações de fornecedores, e a tendência é de continuidade desse processo (GORDINHO, 2010).
“Este pacto permitiu antecipar de 2021 para 2014 o fim da queima da palha de cana, e acabou se tornando padrão, até para certificadoras ambientais. Hoje podemos dizer que São Paulo e seus produtores são referência mundial no manejo sustentável da cana-de-açúcar.” (GORDINHO, 2010)
A questão ambiental envolve cada vez mais os produtores e muitas usinas empreendem ações de proteção e recuperação das matas ciliares. Essa prática, somada ao uso da palha da cana na geração de eletricidade, contribui para reduzir em muitas toneladas a emissão de CO2 na atmosfera.
Sem a adoção do fogo, usa-se a palha da cana antes queimada, para produção de etanol, uma alternativa para aspectos de preservação ambiental e para o aumento da produção, sem aumentar a área plantada de cana, haja vista que o aproveitamento dessa biomassa contribuirá para eliminar o problema das queimadas uma vez que hoje apenas algumas usinas aproveitam parte do bagaço para geração de energia em geradores específicos.
CONCLUSÕES
A constante busca pela auto-suficiência da matriz energética torna este biocombustível competitivo comparado ao tradicional petróleo, combustível usado em alta escala no mercado, conseguinte o custo deverá se equiparar, destacando assim os benefícios ambientais, tornando-se um combustível extraído de recursos renováveis.
Seus índices de emissão de gases poluentes são menores se comparados com os combustíveis fósseis, que por sua vez não são renováveis e emitem uma grande quantidade de gases de efeito estufa como CO2. Essa redução além de não prejudicar o meio ambiente, gera créditos de carbono aos países produtores conforme estabelecido em protocolos internacionais.
É importante observar que a moderna agroindústria da cana-de-açúcar, ainda apresenta grandes possibilidades de diversificação de seus produtos e incremento das disponibilidades energéticas.
Com a utilização das tecnologias em desenvolvimento ou em fase-piloto, caminha - se cada vez mais em direção às biorrefinarias, complexos produtivos capazes de fornecer bioenergia e biomateriais diversos, incluindo alimentos e plásticos biodegradáveis.
Há, certamente, muito que fazer e desafios por superar para a expansão dos sistemas bioenergéticos, mas os benefícios serão proporcionais, pois um desenvolvimento energético saudável e consistente é determinante para consolidar uma nova relação entre a natureza e a sociedade. A produção e o uso de bioetanol de cana-de-açúcar oferecem à perspectiva concreta de começar a construção de uma nova realidade energética, mais sustentável, que faça dessa agroindústria a alavanca de desejáveis transformações sociais e econômicas.
O modelo brasileiro, aperfeiçoado por décadas e com novas possibilidades de se expandir com produtividade e eficiência, está à disposição dos países que, por sua demanda de combustíveis, desejem reduzir suas emissões de gases de efeito estufa e diversificar suas fontes de suprimento energético, ou que, por seu clima, seu solo e sua gente, poderão replicar com sucesso a produção eficiente de biocombustíveis, para uso e benefício de todos.
O bioetanol de cana-de-açúcar pode cumprir um papel relevante na matriz energética de muitos países, embora, pela relativa inovação que implica e pela diversidade das rotas bioenergéticas, seja compreensível que existam questionamentos, preconceitos e desinformações, que precisam ser superados. Adotar programas bioenergéticos eficientes, com características potenciais de mercado, mitigar suas emissões de carbono e melhorar a qualidade do ar, são soluções interessantes, para muitos países que buscam reduzir sua dependência energética derivadas de combustíveis fósseis, devendo ser decisivos em temas energéticos e ambientais.
BIBLIOGRAFIA
BNDES e CGEE; Bioetanol de Cana-de-Açúcar: Energia para o Desenvolvimento Sustentável. - Rio de Janeiro : SENAC - Rio de Janeiro, 2008.
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