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Bicombustível
Dominante nos EUA,
etanol de
milho é opção, no Brasil,
para safra excedente
Aline Marques Bortoletto e André Ricardo Alcarde*
O etanol feito de cana-de-açúcar e milho
representa 82% do mercado mundial
de biocombustíveis. Brasil e EUA são os
maiores produtores de etanol, respon-
sáveis por 90% do mercado mundial.
Entretanto, os dois países apresentam
diferenças fundamentais em seus proces-
sos produtivos. Enquanto no Brasil quase
todo o etanol é produzido a partir de
cana-de-açúcar, nos EUA a matéria-prima
predominante é o milho. O álcool produ-
zido a partir da cana-de-açúcar rende, em
média, 7 mil litros por hectare, enquanto
o de milho rende 3,5 mil litros. Além disso,
sob o ponto de vista ambiental, a cana
também é mais vantajosa, uma vez que
cada unidade de energia fóssil usada
na produção do combustível gera 9,3
unidades de energia. No caso do milho, a
relação é de 1 para 1,5 unidade.
O milho é o cereal mundialmente
dominante para produção de etanol
combustível: da produção mundial de
860 milhões de toneladas do grão (safra
2012/13), cerca de 15% foi utilizado para
a produção de etanol. Os EUA destinam
aproximadamente 43% do total de milho
Mundialmente dominante na produção de etanol, milho cede espaço no Brasil para cana-de-açúcar, principal matéria-prima do nosso biocombustível
GCN
O
ti
Ci
A
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visão agrícola nº13
jul | dez 2015
de Agricultura, envolvendo parâmetros
de odor, infestação por insetos, injúrias,
umidade do grão, massa (densidade do
grão), danos físicos e matéria estranha.
As usinas americanas de etanol a partir
do milho se modernizam, em diversos
aspectos, incluindo mudanças na desti-
lação com tecnologia molecular, aprimo-
ramento no uso de enzimas hidrolíticas
(amilases e glucoamilases), assim como
nas fermentações com mosto de alta den-
sidade a partir de milho moído (ou fracio-
nado), que facilita a hidrólise enzimática
e aumenta o rendimento em etanol. Uma
maneira de aumentar o rendimento do
etanol de milho é a fermentação a partir
de mostos com altas concentrações de
açúcar (ACA), também chamado de alta
densidade (high gravity fermentation).
Esta tecnologia consiste no uso de meio
contendo quantidade superior a 25% (p/v)
de açúcares totais, objetivando atingir
concentração maior que 15% (v/v) de
etanol, no mosto fermentado.
O interesse por este tipo de fermenta-
ção decorre de vantagens econômicas,
tais como: alto rendimento em etanol,
redução de custos de mão-de-obra e
energia por litro de etanol produzido,
diminuição do consumo de água, menor
investimento de capital, melhor assep-
sia, facilidade de limpeza e sanitização.
Com o atual interesse pela tecnologia de
fermentações com mostos ACA, devido
tanto à qualidade do produto quanto à
redução dos custos de produção, pes-
quisas estão sendo realizadas para com-
preensão do metabolismo das leveduras
com relação aos processos da produção
de etanol, excreção de subprodutos e
tolerância das células de leveduras, as
quais requerem nutrientes específicos
para sobreviver ao estresse osmótico e
manter suas funções metabólicas.
A planta do milho tem potencial, tam-
bém, para contribuir com a produção de
etanol a partir da biomassa (palha e es-
piga do milho), constituindo o etanol de
segunda geração, conhecido como etanol
celulósico. Companhias de sementes
trabalham para aumentar a produção
de etanol por unidade de grão e ampliar
o valor dos coprodutos. Aumentos na
produtividade do milho e na biomassa
contribuem para alto rendimento de
etanol, por unidade de área plantada,
reduzindo o uso dos recursos naturais
para a geração do biocombustível, au-
mentando, assim, a possibilidade de
avanços na usina de etanol proveniente
de matéria-prima alimentar.
Diferentemente do processo de produ-
ção de etanol a partir da cana-de-açúcar,
a produção a partir do milho se inicia com
a limpeza dos grãos, que passam por um
processo de desintegração mecânica
e térmica, a fim de gelatinizar o amido
presente no grão e prepará-lo para o
processo de sacarificação enzimática, em
temperaturas entre 65ºC e 80ºC. Os grãos
são triturados em moendas e cozidos em
água fervente ou vapor. A hidrólise do
amido ou sacarificação é feita, principal-
mente, através de método enzimático.
O mosto de milho sacarificado, após ser
diluído a aproximadamente 15% de açú-
car, é colocado numa dorna, juntamente
com nutrientes para as leveduras. O pé de
cuba consiste de fermento previamente
cultivado e multiplicado em uma dorna
separada, objetivando aumentar o vo-
lume de inóculo, já que, neste processo,
não há reciclo de fermento.
Com a adição do fermento na dorna, as
células de levedura continuam a se mul-
tiplicar e, simultaneamente, produzem
etanol. A fermentação leva aproxima-
damente de 28 a 30 horas, permitindo
a degradação de 94% dos açúcares do
mosto. Em condições práticas, um quilo-
grama de amido produz 520 g ou 670 mL
de etanol. Diferentemente da produção
de álcool a partir da cana-de-açúcar, o
fermento não pode ser separado do vi-
nho devido à natureza física do mosto de
milho, mais denso e com material sólido
em suspensão. Assim, após o término da
fermentação, todo o conteúdo da dorna
é destilado, passando pelas etapas de
destilação, retificação e desidratação.
produzido pelo país para a produção de
etanol. Em 2012, a produção dos EUA foi
de 50 bilhões de litros de etanol. No mes-
mo período, o Brasil produziu 23 bilhões
de litros vindos da cana-de-açúcar. Os
EUA contam com cerca de 220 unidades
produtoras de etanol. iowa é o maior
estado americano produtor de milho,
tendo 41 usinas de etanol em operação,
responsáveis pela produção de 14 bilhões
de litros do biocombustível renovável por
ano, correspondentes a 28% da produção
americana de etanol. Esta já responde
por, aproximadamente, 10% da gasoli-
na consumida pelos EUA atualmente.
Os EUA vêm expandindo rapidamente
sua produção de etanol, mesmo sendo
menos competitiva que a de origem na
cana-de-açúcar – produzida no Brasil
e, potencialmente, em muitos outros
países canavieiros –, por reconhecer sua
importância estratégica e seus efeitos na
atividade econômica doméstica.
O milho encontra diversas finalidades
de emprego, englobando o grão como
alimento humano e animal, a produção
de óleo, de etanol, de farelo, de pipoca, o
milho doce etc. O melhoramento genético
do grão deve levar em consideração a
finalidade de uso. A base genética para o
milho comporta mais de 60% do custo do
etanol; a qualidade do grão é uma soma
de diversos fatores que influenciam,
principalmente, na produtividade por
área e rendimento em etanol. Decisões
de manejo da plantação são responsáveis
pela densidade da cultura e aplicação de
fertilizantes no solo. Fatores climáticos
influenciam a adaptação do grão para
fermentação. Decisões de manejo na co-
lheita influenciam na qualidade do grão,
assim como a maior quantidade de água
e elevadas temperaturas geram redução
na produção de etanol por unidade de
grão. Em más condições de estocagem, a
concentração de amido pode ser reduzida
pela ação de insetos e microrganismos
contaminantes. Nos EUA, a qualidade do
milho para a produção de etanol é defi-
nida e padronizada pelo Departamento
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O álcool anidro obtido é armazenado e
a vinhaça, que contém os resíduos do
milho e as células mortas de levedura,
é processada e destinada à alimentação
animal. A vinhaça obtida neste processo
contém alta concentração de proteína.
Apesar de a produção de etanol ser, no
Brasil, basicamente proveniente da cana-
-de-açúcar, uma opção cogitada no país
é a produção do etanol de milho. Favore-
cido pelos preços competitivos do milho,
pela redução dos custos de produção
associada a essa tecnologia e à produção
em expansão no Brasil, o etanol de milho
pode vir a ser uma realidade não tão dis-
tante no país. A produção brasileira de
milho tem apresentado elevadas taxas de
crescimento. Nos últimos 37 anos, passou
de 19 milhões de toneladas, em 1976, para
79 milhões de toneladas na safra que se
encerra em 2013. A produtividade média
dobrou nos últimos 10 anos, chegando
a 5.200 kg/ha na safra atual. Alguns
produtores do Estado do Mato Grosso,
que participa com 22 milhões de tonela-
das da produção nacional, já começaram
a cogitar o uso do excedente de produção
de milho para geração de etanol, buscan-
do saídas para o destino da grande safra,
já que os preços da saca caem e os custos
de transporte se mantêm, tornando proi-
bitivo colocar o milho nos portos.
A produção de etanol de milho gera
também DDG (distillers’ dried grains),
um subproduto com alto valor proteico,
que pode substituir e reduzir o custo da
proteína para ração animal. Uma tonela-
da de milho produz, aproximadamente,
380 litros de etanol e 250 kg de DDG. A
produção de etanol de milho poderia vir
a complementar a oferta do biocombus-
tível no país, uma vez que a previsão de
demanda para os próximos cinco anos é
de 50 a 60 bilhões de litros. No entanto,
para isso seriam necessárias adaptações
nas instalações das usinas ou a constru-
ção de plantas exclusivas para a produ-
ção de etanol de milho, o que implicaria
investimentos substanciais. Outro ponto
importante é ter conhecimento e do-
mínio das tecnologias empregadas no
processo de produção de etanol de milho,
que apresentam diferenças substantivas
em relação às empregadas na produção
de etanol de cana-de-açúcar.
* Aline Marques Bortoletto é doutoranda
do Programa de Pós-Graduação em Ciência e
Tecnologia de Alimentos da USP/ESALQ (aline.
bortoletto@gmail.com) e André Ricardo Al-
carde é professor associado do Departamen-
to de Agroindústria, Alimentos e Nutrição da
USP/ESALQ (andre.alcarde@usp.br).
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é uma tecnologia desenvolvida pela Dow AgroSciences e Monsanto. POWERCORE
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é uma marca da Monsanto LLC.
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