Trajetória e Indicadores Econômico-Financeiros na Agroindústria Canavieira:
o caso do grupo Cosan
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Em 2008 a Cosan comprou os ativos das Exxon Mobil no Brasil. Criou a
Radar, uma empresa do mercado imobiliário rural, e também lançou a Rumo Lo-
gística, a maior exportadora de açúcar do mundo. Incorporou a usina Benálcool;
criou em parceria com a Copersucar e com a Crystalsev a Uniduto Logística S/A,
para construir e operar uma malha de dutos que visa ao transporte de etanol do
interior para o litoral paulista; e fez aquisição da Esso Brasileira de Petróleo Ltda.,
formando a Cosan Combustíveis e Lubrificantes (CCL), que atualmente é deno-
minada Cosan Lubrificantes e Especialidades. Em 2009, a empresa adquiriu os
ativos da Nova América, que incluiu a marca União e a incorporação de mais três
usinas, inaugurou as usinas Jataí em Goiás e Caarapó no Mato Grosso do Sul e
formou uma parceria entre a Rumo Logística e a América Latina Logística (ALL).
Em 2011, a Cosan comprou o capital social da Zanin Açúcar e Álcool, que
incluiu os ativos referentes às atividades industriais e agrícolas, que estão localiza-
dos na região de Araraquara-SP, e um projeto de greenfield em Prata-MG. Ainda
nesse ano, a Cosan e a Shell, a partir de joint venture, criaram a Raízen, que atua
na produção de açúcar e etanol, na distribuição de combustíveis e em energia sus-
tentável; também criou a Novvi, através da integração com a Amyris. Em 2012,
comprou 60,1% da Companhia de Gás de São Paulo (Comgás), fora da cadeia
agroindustrial canavieira.
As aquisições foram feitas de maneira estratégica, levando em consideração o
posicionamento das usinas em relação ao escoamento e à comercialização da pro-
dução, sendo a logística outro ramo de atuação do grupo. A maioria das unidades
que foram incorporadas ao longo desses anos possuía uma localização geográfica
favorável, permitindo à Cosan operar com baixos custos de produção, pois estas
estão estrategicamente posicionadas em clusters de produção, próximas aos clien-
tes, às áreas de cultivo e aos terminais portuários, facilitando o escoamento dos
produtos, que se encontram perto das malhas ferroviárias, fluviais e rodoviárias
localizadas próximas aos principais centros de consumo. Devido aos gargalos em
infraestrutura, foi feito um acordo com a ALL, demonstrando a preocupação com
o escoamento da produção.
A incorporação da unidade Univalem, em Valparaíso-SP, é exemplo de aqui-
sição para a diversificação e a diferenciação do produto, pois é a única unidade
da Cosan que produz açúcar orgânico sem qualquer adição de aditivos químicos,
com certificado de qualidade reconhecido (ISSO 9001:2000), selo de garantia do
Instituto Biodinâmico (IBD), reconhecido internacionalmente e que tem aval da
organização não governamental (ONG) ambientalista Greenpeace. Outra estra-
tégia de diversificação adotada pela empresa foi a cogeração de energia a partir
do bagaço da cana-de-açúcar, a partir do excedente de consumo industrial, que é
comercializado no sistema nacional de energia elétrica.
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Com a aquisição da Esso Brasileira de Petróleo S/A, além de diversificar seu
portfólio, a Cosan se tornou a primeira empresa do setor a verticalizar sua pro-
dução, atuando na distribuição e fabricação de combustíveis e na distribuição de
lubrificantes e combustíveis de aviação da Esso no Brasil, incluindo licença no uso
das marcas Mobil e Esso – esta substituída pela marca Shell, depois da joint venture.
Para completar a verticalização no setor, a empresa fechou um acordo com a ALL
em 2009. Desta forma, a Cosan tornou-se totalmente verticalizada, diversificada e
integrada nos segmentos de energia e infraestrutura, pois opera desde a prospecção
de terras agrícolas, passando pela produção de açúcar e etanol, pela distribuição
e comercialização de açúcar no mercado de varejo, além de distribuição de com-
bustíveis e de comercialização e distribuição de lubrificantes.
Em 2011, a Raízen conseguiu a certificação Bonsucro para três usinas su-
croalcooleiras, atendendo a 48 indicadores e cinco princípios, que visam reduzir
impactos econômicos, sociais e ambientais da atividade. Este selo ambiental passou
a ser uma exigência de exportação para a União Europeia no segmento de açúcar
e álcool. A certificação foi concedida às usinas Costa Pinto (Piracicaba-SP), Bom
Retiro (Capivari-SP) e Jataí-GO. Em 2013, as unidades de Bonfim (Guariba-SP),
Gasa (Andradina-SP) e Univalem (Valparaíso-SP) também foram certificadas,
totalizando seis usinas, cerca de 22% do total de cana moída e 448 mil metros
cúbicos de etanol. Segundo o diretor de Relações Externas e Sustentabilidade,
Claudio Borges Oliveira, a meta é certificar todas as usinas até 2018.
Ainda em 2011, a Cosan firmou uma joint venture com a Amyris, empresa
americana integrada de produtos renováveis, criando a Novvi S/A. A finalidade é
a produção de especialidades químicas, desde a pesquisa, o desenvolvimento e a
produção de óleos básicos sintéticos renováveis feitos a partir da cana-de-açúcar.
Dando curso às ações de expansão, ainda em 2013, a Raízen incorporou
a diversificação do etanol, com investimentos em etanol celulósico, em valores
estimados em R$ 200 milhões, para construir uma unidade de produção na usina
Costa Pinto (Piracicaba-SP). Neste processo, a Raízen deu outro passo em relação à
planta de segunda geração, que foi uma parceria com a Novozymes, multinacional
dinamarquesa líder na área de biotecnologia, atuante no mercado de enzimas e
que tem, no Brasil, uma unidade industrial em Araucária-PR. Com a parceria, a
Novozymes irá fornecer tecnologia de enzimas utilizadas na conversão de mate-
riais celulósicos em açúcares, uma das principais etapas do processo. A unidade
produtora do etanol de segunda geração (2G) começou a produzir no final de
2014, em Piracicaba-SP, devendo fornecer regularmente o produto em 2015,
4
4. A venda do produto ao mesmo preço do etanol de primeira geração se deve ainda a fatores de mercado, uma vez
que é o mesmo produto – o processo de obtenção é que é distinto – e não há como diferenciar preços, ainda que com
custos mais elevados.
Trajetória e Indicadores Econômico-Financeiros na Agroindústria Canavieira:
o caso do grupo Cosan
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sendo pioneira, assim como a GranBio, que tem uma planta em Alagoas; ambas
produzindo a partir do bagaço e da palha da cana.
A figura 1 ilustra as áreas de negócios que foram objeto da estratégia de di-
versificação da Cosan, mostrando o crescente interesse desse grupo por atividades
geradoras de maior valor agregado e capazes de ampliar as sinergias das empresas
constitutivas do grupo.
FIGURA 1
Diversificação de negócios do grupo Cosan em torno da cana-de-açúcar
Cana
Desenvolvimento de terras
Expansão de operações
de combustíveis
Depósitos e outros
Açúcar
Porto
Logística do açúcar
Logística do açúcar e etanol
Etanol
Operações de lubrificantes
Cogeração
Distribuição de combustíveis
Internacionalização das
operações de lubrificantes
Fonte: Cosan (2011).
Atualmente, as empresas que fazem parte do grupo são: Radar Propriedades
Agrícolas, Raízen, Rumo Logística e Cosan Lubrificantes e Especialidades. A partir
de 2012, realiza ainda a distribuição de gás natural em São Paulo, com a compra
da Comgás.
Ainda em 2013, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade)
aprovou a aquisição pela Raízen de 10% de participação no capital social da Serviços
e Tecnologias de Pagamentos S/A (STP), empresa titular do Sem Parar, Via Fácil e
Onda Livre, especializada em soluções de cobrança eletrônica de tarifas de pedágios
em rodovias e de pagamento automático de estacionamento em shopping centers,
aeroportos, entre outros exemplos, e que possui cerca de 4 milhões de usuários.
Entre os objetivos dessa aquisição, está o de diversificação inovadora para desenvol-
ver uma solução de pagamento de combustíveis automático, por meio eletrônico
(aparelho IAV – identificação automática de veículos) para combustíveis da rede
dos postos Shell (Raízen), denominado de Projeto Abastece Fácil, aumentando o
market share no segmento de distribuição de combustíveis, uma vez que a STP
opera em sete estados. O quadro 1 resume outros movimentos de ampliação de
atividades e aquisições do grupo Cosan, entre 2008 e 2012.
Quarenta Anos de Etanol em Larga Escala no Brasil: desafios, crises e perspectivas
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QUADRO 1
Empresas do grupo Cosan – principais aquisições e parcerias da recente fase de expansão
Empresa
Objetivos
Características da atuação
Ações e dados
Radar Propriedades
Agrícolas
Explorar novas oportu-
nidades de negócio no
mercado imobiliário rural.
Empresa dedicada à compra, à
valorização, ao arrendamento e
à venda de terras para diversos
usos. Utiliza sistema de satélite
para avaliar o potencial das terras.
Fundada em 2008. Em 2014,
administrava 107 mil ha de terras
no Maranhão, no Piauí, na Bahia,
em São Paulo e em Mato Grosso.
Investiu US$ 2,6 bilhões até 2011.
Raízen
Levar o etanol à con-
dição de commodity
internacional; ampliar
o market share.
Joint venture entre Cosan e Royal
Dutch Shell. Parceria na produção
e na comercialização de derivados
da cana-de-açúcar, incluindo a
cogeração de energia.
Criada em junho de 2011. A Cosan
tem participação de 50% na Raízen,
51% da empresa de produção
de etanol, açúcar, cogeração de
energia e biotecnologia, e 49% da
distribuidora.
Rumo Logística
Tornar-se o principal
player em logística de
comercialização de açúcar
e etanol; diversificar.
Sistema logístico multimodal de
exportação de açúcar e outros
granéis sólidos. Tem seis terminais
estratégicos – próximos a clientes
e à malha rodoviária e ferroviária.
Criada em 2008, a partir da fusão
do Terminal da Cosan Portuária
com o Terminal Portuário Teaçú.
Capacidade de embarque de 10
milhões de t/ano.
Cosan Lubrificantes
e Especialidades
Diversificar produtos com
verticalização dentro do
seu ramo principal de
negócios.
Produção de lubrificantes. Ampliada
com aquisições e parcerias com
empresas (Toyota, John Deere,
Caterpillar, Honda e SKF e a também
fabricante de lubrificantes S-Oil.)
A Cosan LE foi criada em 2008,
quando a Cosan S/A adquiriu os
ativos de produção e o direito de
uso da marca Mobil e Esso. Em
2011, detinha 13,5% do market
share no país.
Comgás
Diversificação na área
de gás e energia, fora
do seu ramo principal
de negócios.
Fornecimento de gás natural a
residências, comércio e indústrias.
Geração de energia para termoelétrica.
A Cosan S/A e o grupo BG adquiri-
ram, em maio de 2012, 60,05% da
Comgás, a maior do ramo no Brasil.
Elaboração dos autores.
3.3 A formação da Raízen em joint venture Cosan-Shell
Os ativos alocados pela Cosan ao formar a associação com a Shell foram todas as
usinas de açúcar e álcool, todos os projetos de cogeração de energia, o segmento
de distribuição e varejo de combustíveis, os ativos de logística de etanol, US$ 25
milhões em terras e uma dívida líquida de aproximadamente US$ 2.254 milhões.
Não foram incluídos os ativos referentes à Radar, Rumo, Lubrificantes e outros
ativos. Por outro lado, a Shell alocou o segmento brasileiro de distribuição e va-
rejo de combustíveis, negócios de aviação, aporte de aproximadamente US$ 1,6
bilhão, além de participação na Iogen Energy e na Codexis, empresas que operam
no desenvolvimento de combustível de biomassa, incluindo o etanol.
A partir dessa joint venture, a antiga Cosan Açúcar e Álcool (CAA) passou
a ser denominada Raízen Energia, que produz e comercializa os derivados da
cana-de-açúcar, incluindo a cogeração de energia a partir do bagaço da cana.
Criou-se também a Raízen Combustíveis, que responde pela distribuição e pela
Trajetória e Indicadores Econômico-Financeiros na Agroindústria Canavieira:
o caso do grupo Cosan
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comercialização, inclusive de combustíveis para aviação. Também foi criada a
Raízen Trading, que surgiu com a compra da trading Vertical, de capital nacional,
que já possuía escritórios em Genebra (Suíça) e em Houston (Estados Unidos) e
foram abertas unidades comerciais na Bélgica e em Cingapura.
A Raízen está entre as cinco maiores companhias do Brasil em faturamen-
to, com valor de mercado estimado em US$ 20 bilhões de dólares, com 40 mil
funcionários e 860 mil ha de área agrícola cultivada (2013). Formada por 24
usinas/destilarias,
5
possui a capacidade de produção de 1,9 bilhão de litros de
etanol por ano, 4,2 milhões de t de açúcar e produção de 900 MW de energia
elétrica a partir do bagaço da cana-de-açúcar, e suas lavouras atingem um nível
de 91% de mecanização. Atua em 61 terminais de distribuição de combustíveis
e no negócio de combustíveis de aviação em 54 aeroportos, é formada por uma
rede de 4.700 postos de combustíveis com as marcas Shell e Esso e por 720 lojas
de conveniência. Possui cinco escritórios no Brasil e quatro no exterior (Estados
Unidos, Suíça, Inglaterra e Cingapura). No total, comercializa cerca de 22 bilhões
de litros de combustíveis.
Entre os produtos da Raízen, estão ainda o açúcar cristal VHP, destinado ao
mercado externo; o açúcar demerara; o açúcar cristal orgânico; o açúcar líquido
invertido; o açúcar líquido sacarose; o açúcar cristal – tipos 1, 2 e 3; o açúcar
refinado amorfo; o açúcar refinado granulado; e o açúcar de confeiteiro. Os tipos
de etanol hidratado produzidos são: o carburante padrão nacional, padrão Japão,
Korea, Califórnia e outros. Produz também o etanol destilado alcoólico e o etanol
anidro carburante e anidro industrial. A empresa desenvolve ainda estudos de
melhora na queima da palha, visando ao aumento na capacidade de geração.
Cabe destacar que a Raízen possui grande potencial inovador e de adoção de
progresso técnico na área industrial, com o desenvolvimento de pesquisas de novas
tecnologias e soluções práticas. Na fabricação do etanol, por exemplo, a instalação
de peneiras moleculares em suas usinas permite a obtenção do etanol anidro sem a
necessidade da utilização do desidratante ciclo-hexano, técnica que leva à obtenção
de um produto puro e não poluente.
A empresa, além da venda no mercado interno, exporta álcool para fins in-
dustriais, álcool neutro e etanol carburante. Em 2013, era a maior produtora de
excedente de energia elétrica a partir do bagaço da cana, em doze das 24 usinas.
5. As unidades, situadas no estado de São Paulo, são: Unidade Gasa (município de Andradina), Mundial (Mirandópolis),
Univalem (Valparaíso), Benálcool (Bento de Abreu), Destivale (Araçatuba), Parálcool (Paraguaçu Paulista), Maracaí
(Maracaí), Tarumã (Tarumã), Ipaussu (Ipaussu), Junqueira (Igarapava), Bonfim (Guariba), Tamoio e Zanin (Araraquara),
Serra (Ibaté), Dois Córregos (Dois Córregos), Diamante (Jaú), Costa Pinto (Piracicaba), Santa Helena (Rio das Pedras),
Rafard (Rafard), Bom Retiro (Capivari), Barra (Barra Bonita) e São Francisco (Elias Fausto). No estado de Goiás, a unidade
Jataí, no município de mesmo nome;no estado de Mato Grosso do Sul, a unidade Caarapó, no município de Caarapó.
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Comercializa o excedente de energia elétrica diretamente para indústrias ou em
leilões do Sistema Nacional de Transmissão Elétrica, realizados pelo governo federal.
Em março de 2011, a Raízen, em conjunto com outras cinco empresas –
Camargo Corrêa Construções e Participações (10%), Copersucar (20%), Odebrecht
Transport Participações (20%), Petrobras (20%) e Uniduto Logística (10%) –,
criou a Logum Logística S/A. A empresa é responsável pela construção de um
sistema logístico multimodal de transporte e armazenagem de etanol, que abrange
logística, carga e descarga, movimentação e estocagem, operação de portos, termi-
nais terrestres e aquaviários, que envolvem transportes através de dutos, hidrovias
(barcaças), rodovias (caminhões-tanque) e cabotagem (navio).
Também em 2011, a Raízen Trading movimentou entre 6,5 bilhões e 7
bilhões de litros de etanol, incluindo as operações no mercado interno e externo.
Considerando o volume de produção da própria Raízen, que correspondeu a 1,9
bilhão de litros, e o de terceiros, este total foi equivalente a 30% do movimentado
por todo o setor no país.
4 ÍNDICES FINANCEIROS E ECONÔMICOS
As empresas inseridas no cenário internacional cada vez mais competitivo e exi-
gente buscam sempre ampliar seus conhecimentos e obter melhores informações
do mercado e de seus concorrentes. Estudam melhores oportunidades de investi-
mento e financiamento e tomam decisões a partir de objetivos e estratégias. Neste
contexto, os relatórios contábeis das corporações têm grande relevância. Eles
são conhecidos como demonstrações contábeis ou financeiras, que possibilitam
informações compreensíveis e transparentes aos agentes. De acordo com Assaf Neto
(2010), a análise dos dados contábeis que as empresas disponibilizam permite obter
informações de seu desempenho econômico-financeiro, para atender aos objetivos
de análise de investidores, credores, concorrentes, empregados, governo e outros.
Diversas pesquisas na área de contabilidade examinam as relações existentes
entre os dados de demonstrativos financeiros, assim como as informações geradas a
partir deles. Beaver, McNichols e Rhie (2005) utilizam demonstrativos financeiros
para a previsão de falências. Nessa mesma direção, Altman (1968), Altman, Baidya
e Dias (1979) e Kanitz (1978) trabalharam a formulação de modelos de previsão de
falência, baseados exclusivamente em índices financeiros, especialmente os índices
das categorias de liquidez, rentabilidade e endividamento.
Outras pesquisas concentraram a atenção em explicar a capacidade – e in-
capacidade – dos demonstrativos de resultados (DREs) em explicar os retornos
obtidos pelas empresas (Collins, Maydew e Weiss, 1997; Francis e Schipper, 1999).
O estudo de Macedo e Corrar (2010) analisou o desempenho contábil e financeiro
Trajetória e Indicadores Econômico-Financeiros na Agroindústria Canavieira:
o caso do grupo Cosan
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das seguradoras brasileiras, em 2007, a partir dos índices contábil-financeiros,
disponibilizados pela Revista Conjuntura Econômica.
Kaplan e Norton (1997) apontam que os índices financeiros são relevantes
para explicar o desempenho financeiro e econômico de empresas, mas ressaltam que
somente esses indicadores não conseguem traduzir as estratégias das firmas. Apesar
da observação dos autores, o que se nota é que as pesquisas realizadas ainda têm
se concentrado na análise contábil e financeira. Para Omaki (2005), mesmo com
restrições, a utilização de índices financeiros é usual e existem inúmeros estudos
que chegaram a resultados relevantes.
São inúmeros índices para se proceder à avaliação da situação econômico-
-financeira de uma empresa. Para Matarazzo (2010), estes índices podem ser
subdivididos em indicadores financeiros e econômicos. Os índices que retratam
a situação financeira de uma empresa são subdivididos em índices de estrutura
de capitais e índices de liquidez; os indicadores da situação econômica são repre-
sentados pelos índices de rentabilidade. A estrutura apresentada a seguir segue a
classificação de Matarazzo (2010) e ajuda a compreender as estratégias adotadas
pelo grupo econômico estudado neste trabalho.
4.1 Índices de estrutura de capital
De acordo com Matarazzo (2010), os índices de estrutura de capital revelam
as grandes linhas de decisões financeiras, em termos de obtenção e aplicação
de recursos, e também como se encontra o nível de endividamento. Eles estão
assim classificados:
• Participação de capital de terceiros: as empresas possuem duas fontes
de recursos, capital de terceiros e capital próprio; a relação entre essas
fontes compõe o índice de participação de capital de terceiros. Este é um
indicador de risco ou de dependência de terceiros, podendo também ser
chamado de índice de grau de endividamento. Sob a ótica financeira,
quanto menor o índice, melhor é o indicador, pois quanto menor a
relação capitais de terceiros/patrimônio líquido, maior será a liberdade de
decisões financeiras e, portanto, menor, a dependência a esses terceiros.
• Composição do endividamento: indica a porcentagem de obrigações de
curto prazo em relação às obrigações totais. As dívidas podem ser de curto
ou de longo prazo, e, de acordo com o indicador, quanto menor o índice,
melhor. As dívidas de curto prazo necessitam de recursos disponíveis pela
empresa no curto prazo. Nem sempre uma firma está capacitada para
garantir esses recursos em prazos pequenos. Já as dívidas de longo prazo
possuem um tempo maior para serem quitadas.
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• Mobilização do patrimônio líquido: estabelece a relação entre ativo per-
manente e patrimônio líquido e indica a quantidade de recursos próprios
que está imobilizada ou que não está em giro.
A tabela 1 apresenta as equações utilizadas para o cálculo dos índices de
estrutura de capital, assim como suas respectivas interpretações.
TABELA 1
Índices de estrutura de capital
Índice
Equação
Interpretação
Participação de capital de terceiros
[Capital de terceiros/patrimônio líquido]
Quanto menor, melhor o índice
Composição do endividamento
[Passivo circulante/capital de terceiros]
Quanto menor, melhor o índice
Imobilização do patrimônio líquido
[Ativo permanente/patrimônio líquido]
Quanto menor, melhor o índice
Elaboração dos autores.
4.2 Índices de liquidez
Os índices de liquidez, segundo Assaf Neto (2010), demonstram a situação finan-
ceira de uma empresa diante de seus compromissos financeiros – ou seja, medem a
capacidade da empresa de cumprir com o pagamento de suas dívidas. Três índices
compõem essa categoria:
• Liquidez geral: o índice de liquidez geral é a capacidade da empresa
honrar todos os seus compromissos – curto e longo prazos. Tal índice
é utilizado como uma medida de segurança financeira a longo prazo
(Assaf Neto, 2010).
• Liquidez corrente: o índice de liquidez corrente é medido por meio da
relação entre o ativo circulante e o passivo circulante. Diferentemente do
índice anterior, este índice resulta numa medida que permite verificar se a
empresa tem condições de quitar suas dívidas de curto prazo, justamente
com recursos também possuídos no mesmo prazo.
• Liquidez seca: demonstra a porcentagem das dívidas de curto prazo em
condições de serem saldadas mediante a utilização de itens monetários
de maior liquidez do ativo circulante – ou seja, determina a capacidade
de curto prazo de pagamento da empresa, por meio da utilização das
contas do disponível e dos valores a receber.
A tabela 2 apresenta as equações utilizadas para os cálculos dos índices de
liquidez e suas interpretações.
Trajetória e Indicadores Econômico-Financeiros na Agroindústria Canavieira:
o caso do grupo Cosan
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TABELA 2
Índices de liquidez
Índice
Equação
Interpretação
Liquidez geral
[(Ativo circulante + ativo realizável a longo prazo)/capital de terceiros]
Quanto maior, melhor o índice
Liquidez corrente
[Ativo circulante/passivo circulante]
Liquidez seca
[Ativo circulante – estoques/passivo circulante]
Elaboração dos autores.
4.3 Índices de rentabilidade
Os índices de rentabilidade revelam quanto renderam os investimentos da empresa,
indicando o grau de êxito econômico desta. Eles são classificados em três principais
índices, descritos a seguir.
• Margem líquida: indica quanto a empresa obtém de lucro para cada
$ 100 vendidos. É calculado através da relação entre o lucro líquido e
as vendas líquidas.
• Rentabilidade do ativo (ROA): é uma maneira de medir o potencial de
geração de lucro em relação ao total de investimento, mensurado pelo
ativo da empresa. Representa quanto a empresa obteve de lucro líquido
em relação ao ativo.
• Rentabilidade do patrimônio líquido (ROE): representa quanto a em-
presa obteve de lucro para cada $ 100,00 de capital próprio investido
(patrimônio líquido). É um indicador importante para os acionistas,
pois mostra qual a taxa de rendimento do capital próprio, e esta taxa
pode ser comparada com outros rendimentos no mercado, como os de
caderneta de poupança, certificados de depósito bancário (CDBs), fundos
de investimento, letras de câmbio, outras ações etc., de modo a avaliar
se a empresa proporciona uma rentabilidade maior ou menor que estas.
A tabela 3 apresenta as equações utilizadas para os cálculos dos índices de
rentabilidade.
TABELA 3
Índices de rentabilidade
Índice
Equação
Interpretação
Margem líquida
[Lucro líquido/vendas líquidas]
Quanto maior, melhor o índice
ROA
[Lucro líquido/ativo total]
ROE
[Lucro líquido/patrimônio líquido médio]
Elaboração dos autores.
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4.4 Estratégia empírica da pesquisa
Para alcançar o objetivo de pesquisa foram definidos, previamente, alguns passos,
constituindo a estratégia empírica da pesquisa, que será apresentada a partir de
agora. A delimitação espacial da pesquisa refere-se à especificação do agente in-
vestigado, a empresa Cosan S/A Indústria e Comércio, atualmente o maior grupo
sucroalcooleiro do mundo, fato que, conforme apontado na introdução e na revisão
da literatura, justifica a escolha.
A delimitação temporal da pesquisa contemplou os exercícios sociais de 2002
a 2012. O exercício social, denominado ano-safra, referente ao período 2002-2008,
começa em 1
o
de maio e termina em 31 de abril; e o de 2009 a 2012, passa a ser
iniciado em 1
o
de abril e termina em 31 de março.
Os dados necessários à análise foram coletados a partir dos demonstrativos
financeiros do grupo Cosan (balanço patrimonial e demonstrativo de resultado).
Esses demonstrativos padronizados são disponibilizados pelo site da BM&F Bovespa.
As variáveis relevantes para o desenvolvimento da pesquisa foram as seguintes:
ativo total, ativo circulante, passivo total, passivo circulante, patrimônio líquido,
faturamento bruto, faturamento líquido e lucro líquido. Os valores coletados
foram corrigidos pelo Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M) da Fundação
Getúlio Vargas, ano-base 2004.
A partir de então, foram efetivados os cálculos dos índices financeiros. A análise
dos resultados foi feita em uma abordagem evolutiva, no sentido de acompanhar a
variação horizontal – nos anos – dos índices. Além disso, buscou-se verificar se as
estratégias de negócios do grupo Cosan estavam relacionadas de forma consistente
aos resultados financeiros e econômicos obtidos.
5 RESULTADOS PARA OS ÍNDICES ECONÔMICO-FINANCEIRA DO GRUPO COSAN
Nesta seção, serão apresentados os resultados dos índices econômicos e financeiros
do grupo Cosan, assim como as respectivas análises, referentes aos exercícios sociais
de 2002 a 2012. Além da descrição dos indicadores financeiros selecionados, são
feitas considerações interpretativas, a cada período ou evento destacado, ancoradas
na literatura e em outros dados e indicadores disponíveis sobre o grupo.
5.1 Índices de estrutura de capital do grupo Cosan
A tabela 4 apresenta os resultados dos índices de estrutura de capital do grupo
Cosan para o período investigado.
O primeiro índice, participação de capital de terceiros, revela que o grupo
Cosan, em 2002, tomou $ 475,28 emprestados para cada $ 100 próprios – ou
seja, utilizou todo seu capital próprio e ainda necessitou de uma alta quantia de
capital de terceiros. Esta dependência foi em grande parte do período diminuinda,
Trajetória e Indicadores Econômico-Financeiros na Agroindústria Canavieira:
o caso do grupo Cosan
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101
tendo em 2012 a relação de $ 152,32 de capital de terceiros para cada $ 100,00
de capital próprio investido. Este fato revela que o grupo melhorou seu nível de
endividamento, como pode ser observado pela queda do indicador ao longo do
período, mas é ainda dependente de capital de terceiros.
TABELA 4
Índices de estrutura de capital (2002-2012)
(Em %)
Participação de capital de terceiros
Composição do endividamento
Imobilização do patrimônio líquido
2002
475,28
47,48
364,09
2003
309,63
52,29
264,94
2004
256,40
25,26
231,73
2005
316,50
15,62
213,37
2006
282,78
12,83
198,78
2007
121,77
14,26
121,99
2008
215,43
32,07
183,94
2009
173,14
23,94
169,39
2010
176,29
20,55
98,62
2011
130,07
16,61
69,48
2012
152,32
23,09
72,51
Elaboração dos autores.
Por meio da análise da composição do endividamento do grupo, é possível
afirmar que seu perfil de dívida é bom, pois, em quase todos os períodos analisados –
exceto 2003 –, mais da metade da dívida é de longo prazo. A especificação do que
é considerada “dívida boa” está relacionada ao prazo de pagamento desta. Prazos
de pagamentos mais dilatados representam maior tempo para que a empresa gere
recursos para o pagamento da dívida e, por esse motivo, dão uma característica
positiva à obrigação. Quanto maior a proporção das dívidas que vencem em longo
prazo, melhor o perfil do endividamento.
O último índice de estrutura de capital, a imobilização do patrimônio líquido,
aponta que, na maioria dos anos da série, exceto 2010, 2011 e 2012, o patrimônio
líquido foi insuficiente para financiar o ativo permanente e o capital de giro do
grupo Cosan. Somente nos três últimos anos da série, uma parcela do capital pró-
prio foi destinada ao financiamento de parte do capital de giro. Em 2012, foram
investidos 72,51% no ativo permanente e o restante, 27,49%, foi direcionado
ao ativo circulante. Tal fato explica, inclusive, a retração do endividamento nos
últimos anos investigados, uma vez que o grupo, nesse período, também contou
com recursos próprios, financiando seu giro.
O endividamento, analisado pelos índices de estrutura de capital, é explicado
pelas estratégias do grupo Cosan – ou seja, pelas aquisições realizadas ao longo
do período. Com o passar do tempo, o grupo foi crescendo, e isso é sinônimo
de novas aquisições, fazendo aumentar os seus ativos. Tal incremento nos ativos
Quarenta Anos de Etanol em Larga Escala no Brasil: desafios, crises e perspectivas
102
|
é acompanhado da maior necessidade de financiamentos externos. Portanto, em
grande parte dos momentos em que há crescimento no nível de endividamento,
há também novas aquisições por parte do grupo. Por exemplo, em 2008, todos os
índices de estrutura de capital tiveram um aumento significativo. Nesse período,
a Cosan comprou ativos da Exxon Mobil no Brasil e já buscava financiamento
para a compra de ativos da NovAmérica – que se efetivou em 2009 –, que incluiu
a marca União e a incorporação de mais três usinas. Ainda em 2008, comprou
a Esso Brasileira de Petróleo, formando a Cosan Lubrificantes e Especialidades.
Outro período, dentro do investigado, em que é possível identificar aumento
no endividamento, é entre 2004 e 2005. Conforme já mencionado, em 2005, o
grupo Cosan tornou-se o maior acionista do grupo Kuok e aliou-se aos grupos
Crystalsev, Cargill, NovAmérica e Plínio Nastari, para a formação do Teas. Além
disso, passou a ser detentor de 100% do capital social da usina FBA. Para tudo
isso, recursos foram necessários. Não apenas capital próprio, mas também capital
de terceiros. Tais fatores explicam aumento do endividamento no período. Naquele
ano, a Cosan lançou sua IPO, onde obteve uma captação primária de US$ 403
milhões, aumentando seu patrimônio líquido e contribuindo para a aquisição de
cinco usinas.
E, por fim, em 2012, o grupo Cosan adquiriu 60% da Comgás. Observa-se,
novamente, que junto de uma elevação dos investimentos realizados pelo grupo, há
também um aumento na necessidade de recursos, inclusive de terceiros. Por todos
esses motivos mencionados, é possível compreender as variações no endividamento
do grupo Cosan entre 2002 e 2012. A análise desses índices deve, portanto, estar
vinculada às decisões de investimentos e financiamentos do grupo.
5.2 Índices de liquidez do grupo Cosan
A tabela 5 apresenta os resultados dos três índices de liquidez do grupo Cosan em
todo o período investigado.
TABELA 5
Índices de liquidez (2002-2012)
Liquidez geral
Liquidez corrente
Liquidez seca
2002
0,44
0,79
0,41
2003
0,49
0,76
0,38
2004
0,49
1,62
0,76
2005
0,65
3,20
2,42
2006
0,66
3,76
2,91
2007
0,82
3,95
2,97
2008
0,61
1,32
0,85
2009
0,60
1,84
1,34
2010
0,59
1,41
1,14
2011
0,71
2,27
1,91
2012
0,64
1,39
1,20
Elaboração dos autores.
Trajetória e Indicadores Econômico-Financeiros na Agroindústria Canavieira:
o caso do grupo Cosan
|
103
Para os resultados do índice de liquidez geral, no período investigado, e na
hipótese de pagamento imediato da totalidade de dívidas (curto e longo prazos),
o grupo Cosan não teria recursos suficientes (ativo circulante e realizável a longo
prazo) para tal. Em 2002, a Cosan pagaria 44% de suas dívidas; em 2012, 64% da
totalidade. A bem da verdade, essa é uma análise pouco aprofundada e que pouco
diz sobre a capacidade de pagamento e sustentação financeira de uma empresa.
Conforme já mencionado, trata-se apenas de uma hipótese, uma vez que essas
dívidas têm prazos de vencimentos distintos.
Para uma análise mais detalhada, é de suma relevância identificar, entre o
total da dívida, aquela parte que vence em prazo menor. E essa é a ideia do índice
de liquidez corrente. Para a Cosan, considerando todo o período investigado,
apenas em 2002 é que o grupo não tinha capacidade para o pagamento integral
das dívidas de curto prazo. No entanto, já em 2004 e em todos os anos até 2012,
a empresa reverte esse quadro. Os indicadores apontam que o grupo, além de ter
condições de pagar as suas dívidas consideradas mais críticas, ainda possui uma
margem financeira de segurança.
Após a abertura de capital na bolsa de valores em 2005, houve um aumento
significativo na liquidez corrente da empresa. O correspondente índice passou de
1,62, em 2004, para 3,20, em 2005. Em 2008, o indicador sofreu uma queda
significativa, que pode ser explicada pelo aumento do endividamento acima do
aumento do nível do capital de giro. No entanto, o grupo se recupera e o índice
volta a crescer em 2009 e atinge 2,27 em 2011. Em 2012, o indicador declina para
1,39, devido, mais uma vez lembrando, à aquisição de 60,5% das ações Comgás,
dos quais R$ 3,3 bilhões do total de R$ 3,4 bilhões vieram de financiamentos.
Os índices de liquidez seca seguem a mesma trajetória dos índices de liquidez
corrente, com exceção de 2008, em que o indicador aponta para a incapacidade
de pagamento das dívidas de curto prazo, apenas considerando os recursos de
liquidez imediata.
Em resumo, ao vincular a análise dos índices de liquidez ao estudo dos índices
de estrutura de capital, é possível concluir que: i) o grupo Cosan, com o passar
dos anos, cresceu e participou de diversos processos de aquisição. A consequência
natural disso foi o aumento dos ativos do grupo, acompanhado de um aumento
no endividamento; ii) grande parte das dívidas assumidas é de longo prazo – ou
seja, vai ao encontro dos prazos de retornos dos investimentos em ativo permanente
realizados. Tal situação, do ponto de vista financeiro, é considerada positiva, uma
vez que pouco compromete a capacidade de pagamento do grupo no curto prazo.
Análises que apontem apenas o endividamento como sinal de crise devem
também ser vistas com todo o cuidado e profundidade, para que não se incorra em
diagnósticos equivocados. Além disso, o benefício fiscal (Imposto de Renda – IR)
Quarenta Anos de Etanol em Larga Escala no Brasil: desafios, crises e perspectivas
104
|
incidente sobre o juro do capital de terceiros, em muitos casos, pode favorecer a
utilização dessa modalidade de recursos em detrimento do capital próprio.
5.3 Índices de rentabilidade do grupo Cosan
A tabela 6 apresenta os resultados dos índices de rentabilidade do grupo Cosan
em todo o período investigado.
TABELA 6
Índices de rentabilidade (2002-2012)
(Em %)
Margem líquida
Rentabilidade do ativo
Rentabilidade do patrimônio líquido
2002
1,81
1,19
6,80
2003
2,04
1,30
5,38
2004
0,90
0,63
2,24
2005
-2,61
-1,14
-4,76
2006
9,91
5,70
21,90
2007
-1,75
-0,65
-1,44
2008
-7,56
-4,45
-14,08
2009
6,43
7,04
19,31
2010
4,27
4,12
11,37
2011
10,81
11,78
27,10
2012
2,89
2,57
6,48
Elaboração dos autores.
O primeiro índice analisado estabelece a relação entre as vendas do grupo e
seu resultado final, ou, mais especificamente, apresenta a porcentagem de recursos
disponível para reinvestimento ou incremento do patrimônio líquido do grupo.
A média da margem líquida do grupo Cosan correspondeu a 2,47%, entre 2002
e 2012, tendo oscilado de taxas negativas – por exemplo, 2005, 2007 e 2008 – a
altamente positivas – por exemplo, 2009 e 2011.
A rentabilidade do ativo, que indica, em linhas gerais, a remuneração dos
investimentos do grupo, ou, de forma simplificada, o retorno para cada unidade
de investimento, entre 2002 e 2012, teve média de 2,56%, com pico em 2011 de
11,78%. Por fim, a rentabilidade do patrimônio líquido, que representa a remu-
neração do capital próprio (recursos dos acionistas) apresentou média bastante
satisfatória no período, atingindo 7,34%, com fortes oscilações entre 2005 e 2011,
principalmente.
É importante evidenciar que índices negativos, ou quedas bruscas, não neces-
sariamente representam períodos de crises no setor ou no grupo. A interpretação dos
índices de rentabilidade deve ser realizada a partir de uma análise pormenorizada
do lucro líquido, assim como de receita de vendas, total de ativos e patrimônio
líquido do grupo.
Trajetória e Indicadores Econômico-Financeiros na Agroindústria Canavieira:
o caso do grupo Cosan
|
105
A tabela 7 apresenta as principais oscilações ocorridas nessas contas e em
outras também classificadas como relevantes para a compreensão das variações
nos índices. Os valores foram corrigidos pelo IGP-M, com 2002 como ano-base.
TABELA 7
Variação nas contas vinculadas aos índices de rentabilidade (2002-2012)
Anos
Receita líquida
Resultado líquido
Ativo total
Dívidas
Patrimônio líquido
2002
100,0
100,0
100,0
100,0
100,0
2003
100,4
113,1
103,6
93,1
143,0
2004
107,1
53,3
100,6
87,2
161,6
2005
137,0
-197,3
205,2
187,5
281,6
2006
192,6
1.054,8
219,4
194,8
327,4
2007
137,6
-132,8
243,8
161,0
628,5
2008
281,8
-1.177,1
313,8
257,7
568,5
2009
700,4
2.490,0
419,4
319,5
877,0
2010
748,1
1.766,1
509,1
391,7
1.055,9
2011
941,9
5.629,8
567,1
386,6
1.412,6
2012
1.089,6
1.742,1
804,6
585,7
1.827,4
Elaboração dos autores.
De forma a simplificar a análise, foram atribuídos números-índices aos valores,
sendo que 2002 representa o período-base. Os índices dos anos seguintes foram
calculados a partir da variação real dos valores, sempre em comparação ao ano-base.
As receitas de vendas do grupo Cosan são crescentes em quase toda a série,
exceto entre 2006 e 2007, onde é possível observar uma retração de 28,5%. Ainda
assim, se comparada à receita observada em 2002, a receita de 2007 é 37% supe-
rior. Tais dados, apresentados em base real, afastam a hipótese de inserção na crise
setorial, já que as vendas do grupo Cosan se mantiveram em ritmo acelerado em
todo o período, alcançando entre 2002 e 2012 um crescimento de quase 1.000%.
O resultado líquido, se comparado de uma ponta à outra (2002-2012), cres-
ceu em proporção maior que a receita líquida, cerca de 1.600%. No entanto, há
três anos em que é possível identificar situações de prejuízos: 2005, 2007 e 2008.
Para 2005, é possível notar um incremento de 28% nas receitas – em rela-
ção a 2004; no entanto, há um grande decréscimo no resultado líquido (470%,
se comparado a 2004). Em 2005, há um aumento considerável nas despesas
operacionais do grupo Cosan. Entre as despesas que mais aumentaram, podem-
-se citar: despesas financeiras (140% de incremento), amortização de ágio (53%
de aumento) e um gasto “novo” de quase R$ 53 milhões, referente à colocação
de ações, decorrente da abertura de capital ocorrida em 2005. Essas despesas
Quarenta Anos de Etanol em Larga Escala no Brasil: desafios, crises e perspectivas
106
|
consumiram todo o lucro bruto do grupo e resultaram em um prejuízo líquido
no ano em questão.
Ainda em 2005, houve um incremento de cerca de 104% no total de ativos
e de aproximadamente 74% no patrimônio líquido, decorrente da abertura de
capital (IPO) ocorrida em 2005.
A partir da análise, principalmente de receitas e despesas da empresa, é
possível concluir que as despesas financeiras do grupo Cosan, em 2005, foram as
responsáveis pelo resultado líquido negativo obtido. Com isso, independentemente
das variações positivas observadas nas contas de investimentos e capital próprio,
os índices de rentabilidade permanecem negativos (tabela 6).
Em 2007, outro ano em que foi possível notar um prejuízo líquido nas contas
do grupo Cosan, houve uma retração de 28% nas vendas (receitas líquidas), se
comparadas ao ano anterior. Os custos produtivos foram os grandes vilões nesse ano;
mesmo com vendas menores, houve um incremento nesses custos, que consumiu o
resultado bruto, indicando a ausência de economia de escala. Além desses custos,
as despesas de vendas (operacionais) também cresceram e corroeram os resultados
operacionais e líquidos.
Ainda em 2007, o ativo do grupo foi incrementado em 11% – comparado
a 2006 –, sendo que, desse aumento, 67% são referentes ao imobilizado, no ativo
permanente. Tal aumento está relacionado à incorporação da usina Santa Luzia e
da criação da holding Cosan Limited, em 2007. Já o patrimônio líquido do grupo
Cosan foi aumentado em 92% – comparado a 2006 –, sendo que houve uma
retração na subconta de reserva de lucros – que absorveu o prejuízo obtido – e
um grande aumento na subconta capital social realizado (146%). O aumento no
capital próprio foi decorrente do aumento no capital social realizado, por meio de
uma IPO na bolsa de valores de Nova Iorque.
E, por fim, o último ano em que a Cosan teve resultado líquido negativo foi
2008. Nesse ano, as vendas do grupo cresceram 105%. O resultado bruto (diferença
entre receitas de vendas e custos produtivos), embora positivo, foi integralmente
consumido pelas despesas operacionais. Ressalte-se que grande parte das despesas
operacionais aumentou, como era esperado, em decorrência do incremento nas
vendas. No entanto, as despesas financeiras, em 2008, ficaram em mais de
R$ 800 milhões, enquanto no ano anterior (2007) houve uma receita financeira
de quase R$ 300 milhões. Esse descompasso fez com que os resultados operacional
e líquido fossem negativos em 2008.
Em 2008, os ativos da Cosan foram aumentados em quase 29%, se com-
parados à 2007. Deve ser ressaltado que, em 2008, o grupo incorporou a usina
Benálcool, criou a Uniduto Logística e fez a aquisição da Esso Brasileira, formando
Trajetória e Indicadores Econômico-Financeiros na Agroindústria Canavieira:
o caso do grupo Cosan
|
107
a Cosan Lubrificantes e Especialidades. A partir dessa última aquisição, a Cosan se
tornou a primeira companhia de energia renovável totalmente integrada. Foram
adquiridos os ativos de distribuição de combustíveis e fabricação de lubrificantes,
incluindo as licenças de uso das marcas Esso e Mobil – o que justifica o aumento
do ativo intangível.
Considera-se, ainda, que o capital social da empresa (recursos injetados pelos
acionistas) aumentou cerca de 30%, de 2007 para 2008. No entanto, devido ao
prejuízo obtido, as reservas de lucro acumuladas até 2007 foram desfeitas e a variação
líquida no patrimônio líquido em 2008 foi negativa (9,5%).
Além dos indicadores apresentados acerca da rentabilidade, na tabela 6, e
dos dados constantes, na tabela 7, a leitura atenta das informações do grupo em
análise aponta o seguinte perfil de movimentos, os quais podem explicar parte da
oscilação nos indicadores apresentados:
• Entre 2004 e 2012, foi marcante o movimento do grupo Cosan em ações
empresariais focadas no crescimento do ativo total – com destaque para
o imobilizado, com compra de diversas usinas, algumas de grande porte
e intangíveis.
• Para efetivar a estratégia de aquisições com verticalização, ampliação e
diversificação dos negócios, em parcerias com grandes grupos, o grupo
Cosan optou por fazer subscrição de capital, financiamentos e inversão
de recursos (capital próprio) nos anos de maior rentabilidade.
Assim, esse conjunto de movimentos resulta nas oscilações observadas nos
itens receitas, resultados líquidos, investimentos (ativos), capital próprio (patrimô-
nio líquido) e dívidas (passivos). Desta forma, em situações como essa, é aceitável
e até compreensível que haja oscilações intercaladas de rentabilidade (positiva e
negativa), dada a estratégia de crescimento adotada. Assim, a oscilação na renta-
bilidade e no lucro líquido tem explicações a partir da estratégia do grupo, não
sendo um indicador de crise.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A trajetória do grupo Cosan pode ser resumida como a soma de oportunidades e
iniciativas de um núcleo familiar que, explorando as possibilidades abertas pelos
mercados de terra no interior de São Paulo no início do século XX, se tornou
proprietário de terras; base material a partir da qual avança para o setor industrial
canavieiro, convertendo-se, no início dos anos 1940, em usineiro. Desde então, o
grupo põe em movimento uma estratégia de crescimento fundada em aquisições
de usinas concorrentes, consolidando-se, já no final da década de 1990, como o
maior grupo usineiro do Brasil. Na segunda metade da década de 2000, o grupo
Quarenta Anos de Etanol em Larga Escala no Brasil: desafios, crises e perspectivas
108
|
abre seu capital e inicia um vigoroso processo de diversificação produtiva. Tal es-
tratégia pode ser identificada, de acordo com a literatura, como de diversificação
relacionada restrita, no qual menos de 70% da receita vêm do negócio predominante
– no caso, açúcar e álcool – e todos os negócios compartilham elos de produtos
tecnológicos e de distribuição.
Esse processo foi analisado neste capítulo, que procurou identificar se a
estratégia teria sido, de acordo com a metodologia proposta, compatível com a
sustentabilidade econômico-financeira do grupo. O trabalho aponta consistência
entre a trajetória e a situação econômico-financeira, ao mesmo tempo em que res-
salta as dificuldades de se reproduzir o caso, devido a mudanças na agroindústria
canavieira. Entre tais mudanças, estão: a maior dificuldade de acesso à terra (elevação
de preços, concorrência com commodities e criação de gado bovino etc.); a elevação
do custo do crédito fora do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e
Social (BNDES); a continuidade de incertezas na política macroeconômica (taxa
de juros, câmbio e medidas de controle de preços da gasolina). A própria entrada
de grupos dinâmicos concorrentes no mercado é outra mudança que dificultaria
a replicação de trajetórias com o mesmo porte e perfil.
Os índices financeiros destacados permitem concluir que o grupo Cosan
apresentou situação econômico-financeira sólida no período analisado, e que o
elevado nível de endividamento observado – recentemente em queda – esteve
sempre relacionado ao alto nível de investimento realizado. A variação das vendas
líquidas foi um indicador relevante que apontou para a viabilidade econômica do
conjunto de investimentos, uma vez que, em quase todos os períodos – exceto
2007 –, o incremento das vendas foi verificado.
Destaca-se, ainda, a opção da empresa integrada e verticalizada que busca
expandir seus negócios com abordagem comercial agressiva, mas inovadora, atenta
a oportunidades de incorporações e aquisições. Nesse aspecto, as medidas adotadas
pelo grupo mostraram-se capazes de superar adversidades, porém sem ancorar-se
no produto etanol, o qual é o foco da crise setorial. O grupo apresenta indepen-
dência dos negócios e proporciona ganhos em termos de sinergia operacional, de
produtividade e de ganho de escala.
Devido ainda à sua condição de líder global de mercado, o grupo estudado
possui vantagens competitivas significativas em relação aos seus concorrentes,
tanto em custos operacionais, no maior poder de negociação e logística integrada,
quanto em poder de mercado. O grupo passou por reestruturação em seu pla-
nejamento e adotou uma série de ações e iniciativas, conservando e ampliando
posições e estratégias em distintos momentos de crises. Entre as ações adotadas,
cabe mencionar as incorporações, a diferenciação de produtos, a intensificação
da produção, a integração vertical, as inovações tecnológicas, as parcerias com
Trajetória e Indicadores Econômico-Financeiros na Agroindústria Canavieira:
o caso do grupo Cosan
|
109
diversos agentes e a diversificação de produtos e atividades. Dessa forma, pôde
adaptar-se bem às mudanças institucionais e do mercado, superando ambientes
de incerteza na atividade sucroalcooleira, optando por incorporar ao seu portfólio
novos produtos e atividades.
A divulgação de um número maior de indicadores, por parte das próprias
empresas, principalmente aquelas sem abertura de capital, é outro fator que con-
tribuiria para explicitar o tipo de políticas necessárias ao setor. Resultados parciais
negativos em alguns indicadores não implicam crise, como visto no texto, embora
cada empresa tenha distinta condição de superá-los.
Pelo lado de políticas públicas, este trabalho tanto evidencia o potencial
de estudos de grupos econômicos atuantes na agroindústria canavieira quanto
fomenta o debate sobre as diferenças dos agentes na atividade. A explicitação de
indicadores econômico-financeiros complementares àqueles destacados no capítulo
1 deste livro é um desses potenciais. A noção da intensidade de capital, capacidades
e complexidade a que chegou o grupo líder é também ilustrativa do potencial da
agroindústria brasileira. Outras reflexões e estudos dessa natureza, abrangendo
empresas de outro porte e perfil, podem fomentar políticas públicas voltadas para
a dinamização da cadeia produtiva.
REFERÊNCIAS
ALTMAN, E. L. Financial ratios, discriminant analysis, and the prediction of
corporate bankruptcy. Journal of Finance, v. 23, n. 4, p. 589-609, 1968.
ALTMAN, E. L.; BAIDYA, T. K. N.; DIAS, L. M. R. Previsão de problemas
financeiros em empresas. Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v.
19, n. 1, p. 17-28, 1979. Disponível em: Dostları ilə paylaş: |