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Desafios e Caminhos da Pesquisa e Inovação no Setor Sucroenergético no Brasil
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267
Neste trabalho, não se analisou se a baixa porcentagem de desembolso
(de 44,59% a 50,62%, como visto na tabela 1) é influenciada pela descentralização das
ações (e da gestão) em diversos fundos menos especializados. Deixando essa tarefa
para outros estudos e para os gestores, importa destacar que o CT-Energia apresenta
maior desembolso (82,84%) para o conjunto dos projetos sob sua execução.
4.1 Características das linhas de pesquisa, temas e desafios presentes nos projetos
Entre os 379 projetos, parte significativa do desembolso (24,60% do total) foi
destinada para a construção ou ampliação de infraestruturas de pesquisa, principalmente
laboratórios (tabela 2). Esse valor foi superado apenas pelo aporte em P&D
tecnológica direta no processo industrial, que teve 130 projetos e respondeu por
38,85% do desembolso. Conforme se observa na tabela, o grande tema agricultura,
com noventa projetos e 14,76% do desembolso, tem também destaque. Os projetos
de menor custo, na média, são uma característica da etapa agrícola, assim como
“Outros”, por serem de natureza incremental ou exploratória.
TABELA 2
Desembolso e número de projetos por grandes temas
Grandes temas
Desembolso
(R$ INPC 12/2011)
Número
de projetos
Desembolso
(%)
Média
(R$/projeto)
Processo industrial (insumos de processo, materiais e equipamentos para uso
industrial)
60.897.750
130
38,85
468.444
Infraestrutura física (criação, ampliação e reforma de laboratórios)
38.558.264
18
24,60
2.142.126
Agricultura (cultivares, genoma, organismos geneticamente modificados – OGMs,
plantio, colheita)
23.134.448
90
14,76
257.049
Outros (novos usos – ex.: hidrogênio –, monitoramento, modelagens, multitemáticos)
12.766.085
88
8,14
145.069
gestão – capacitação, redes, métodos de gestão/certificação e eventos)
9.668.072
18
6,17
537.115
Cogeração elétrica (gaseificação, conversão de energia, pirólise e equipamentos)
6.110.357
16
3,90
381.897
Indefinido nas descritivas
4.302.943
4
2,75
1.075.736
Meio ambiente e sustentabilidade (diretamente ligados à cadeia produtiva)
1.316.344
15
0,84
87.756
Todos
156.754.263
379
100,00
413.600
Fonte: Base de dados do MCTI.
Elaboração dos autores.
Abrindo-se um pouco mais os temas de pesquisa, pode-se obter resultados
por desafios tecnológicos específicos (temas emergentes), os quais, na atividade
sucroenergética, são geralmente apresentados em projetos nas áreas de
agronomia, química, bioquímica e engenharias. Seguindo os temas emergentes
descritos na seção 2, apresenta-se, na tabela 3, o conjunto dos 379 projetos
da área, agrupados em cinco temas emergentes específicos e um agrupamento
que engloba outros, conforme definido nas notas da tabela.
Quarenta Anos de Etanol em Larga Escala no Brasil: desafios, crises e perspectivas
268
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TABELA 3
Características dos projetos da área sucroenergética no FNDCT por grupo de desafios
Temas emergentes ou
desafios de P&D
Número
de
projetos
Desembolso
(R$ INPC 12/2011)
Média de
desembolso (R$/
projeto)
Instituição
predominante
Estado
Ano do
primeiro
projeto
Obtenção de hidrogênio a partir
do etanol
1
39
13.077.721
335.326
INT e USP
SP e RJ
2001
Cogeração elétrica e gaseificação
da biomassa
2
22
7.271.054
330.502
Unicamp e empresas
SP, RJ, RS, PE e CE
2003
Etanol ligno-celulósico
3
65
14.155.017
217.769
USP, UFRJ e UnB
SP, RJ e MG
2007
Produtividade e variedade de matérias-
-primas
4
79
21.594.439
273.347
UFPE, Embrapa e USP
SP, PE e RJ
2001
Aprimoramento da primeira geração
5
36
11.781.416
327.261
CTC, empresas, USP e Unicamp
SP, MG e RJ
2001
Outros temas/usos e infraestrutruras
6
138
88.874.616
644.018
USP, Unicamp, Embrapa e UFSCar
SP, RJ e MG
2000
Fonte: MCTI.
Elaboração dos autores.
Notas:
1
Neste grupo, estão os projetos sobre obtenção do hidrogênio por reforma do etanol, desenvolvimento de células a
combustível e membranas que operem com o etanol, catalisadores e rotas de obtenção do hidrogênio.
2
Inclui a pesquisa sobre eficiência da queima, catalizadores, pirólise, equipamentos, conversão de energia e outros
destinados ao aproveitamento da matéria vegetal não direcionada para etanol e açúcar.
3
Os estudos sobre etanol ligno-celulósico e outros de segunda geração abrangem o pré-tratamento da matéria-prima,
componentes de rotas tecnológicas, hidrólise, enzimas, leveduras, equipamentos e processo de produção.
4
Os projetos sobre produtividade e variedade incluem estudos sobre: tolerância à seca, algas, outras matérias-primas,
respostas à genética e aos OGMs, equipamentos, microbiologia e controle de pragas.
5
Os projetos sobre o etanol de primeira geração incluem: aprimoramento da fermentação/leveduras, agregação de valor
a coprodutos, melhorias e criação de equipamentos e insumos para plantio, colheita e industrialização.
6
Em “outros tema/usos” estão incluídos: combustível de aviação, polímeros e derivados, aditivos, biogás, fertilizantes,
tortas para alimento, bem como modelagem de sistemas de produção, sustentabilidade e meio ambiente, desempenho
do etanol em veículos e infraestruturas laboratoriais.
Como se observa na tabela, é relevante a presença de temas emergentes nos
projetos, inclusive tendo-se iniciado no início do funcionamento dos fundos setoriais.
Contudo, os valores médios dos projetos, em alguns dos temas centrais, indicam a
natureza exploratória da P&D financiada. A Universidade de São Paulo (USP) se
destaca como principal instituição (soma as condições de proponente e executora),
assim como os estados da região Sudeste. O grupo outros temas/usos tem maior
média devido a grandes projetos de infraestrutura.
4.2 Características dos projetos quanto a trajetória, distribuição geográfica e porte
Feitas as considerações sobre a natureza técnica dos projetos, cabe ilustrar alguns
aspectos relativos à sua gestão e características, tendo em vista a avaliação da política pública.
Tanto a contratação de projetos quanto o desembolso sofreram grande oscilação
no período analisado, conforme se observa no gráfico 1. Destacam-se consideráveis
elevações seguidas de decréscimos de recursos, evidenciando a descontinuidade do
apoio à área. A partir de 2010, todo o FNDCT reduziu o montante alocado, embora
aquele tenha sido o ano de maior contratação, inclusive na área sucroenergética,
com 122 projetos aprovados.
Desafios e Caminhos da Pesquisa e Inovação no Setor Sucroenergético no Brasil
|
269
GRÁFICO 1
Projetos da área sucroenergética nos fundos setoriais (1999-2012)
Desembolso (R$ – INPC 31/12/2011)
Contratado (R$ – INPC 31/12/2011)
Número de projetos contratados por ano
0
20
40
60
80
100
120
140
0
20
40
60
80
100
120
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
N
úmero
de projetos por ano
V
alo
r
co
n
tra
ta
d
o
/d
es
em
b
o
ls
ad
o
(R$ milh
õ
es
– I
N
PC
2011)
Fonte: Base de dados MCTI.
Elaboração dos autores.
Além das oscilações apresentadas, o apoio às pesquisas no âmbito dos temas da
área sucroenergética tem porte pequeno, conforme já argumentado anteriormente,
em termos comparativos com países líderes (Santos, 2015) ou mesmo em rela-
ção ao programa de P&D da Aneel, destacados na seção 4. É ilustrativo alongar a
abordagem desse porte. Para tanto, utilizam-se 343 projetos entre os 379, tendo-se
retirado os extremos considerados fora do perfil
14
ou que podem trazer viés.
A tabela 4 resume a distribuição dos recursos e o perfil dos projetos assim obtidos.
Observa-se que um grande número de projetos tem pequeno porte, assim considerados
os de valores abaixo de R$ 100 mil, que somam 185 estudos (54% dos 343) e
receberam menos de 5% dos recursos.
TABELA 4
Desembolso segundo o número e o porte dos projetos
Faixa de desembolso (R$ – INPC 12/2011)
Número de
projetos
Desembolso (R$/projeto – INPC 12/2011)
Desembolso (%)
De 10 mil a menos de 50 mil
143
3.334.336
2,32
De 50 mil a menos de 100 mil
42
2.969.368
2,07
De 100 mil a menos de 200 mil
36
5.152.146
3,59
De 200 mil a menos de 400 mil
42
11.870.243
8,27
De 400 mil a 800 mil
40
23.540.375
16,40
De 800 mil a 1,6 mil
16
17.308.444
12,06
Acima de 1,6 mil
24
79.338.918
55,28
Todos
343
143.513.829
100,00
Fonte: MCTI.
Elaboração dos autores.
14. Foram retirados, para esse exercício, os extremos, a valores atualizados, de maior desembolso (um projeto de
R$ 13,025 milhões para uma só infraestrutura) e de menor desembolso (35 projetos inferiores a R$ 10 mil, menos
de 90% do valor pleiteado pelo menor projeto aprovado, não tendo perfil de P&D).
Quarenta Anos de Etanol em Larga Escala no Brasil: desafios, crises e perspectivas
270
|
Além dos dados apresentados na tabela 3, observou-se que 90% dos 343
projetos (os 309 de menor valor) contaram com 36,46% dos recursos desembolsados,
enquanto os demais 10% contaram com 66,54%. Esses dados indicam que,
embora exista a pulverização e um montante pequeno de recursos, se considerados
os quatorze anos analisados e a importância estratégica da área, também tem sido
alcançada alguma concentração de recursos em temas e ações eleitas como prioritárias.
Essa concentração em 10% dos projetos tem ocorrido dentro das possibilidades
de ações transversais e arranjos em que recursos de diversos fundos setoriais se
somam para apoio a temas eleitos. Entre esses 34 maiores projetos, apenas três
foram contratados junto ao CT-Energia e um junto ao CT-Agro, que são os fundos
setoriais mais diretamente ligados a temas da cadeia produtiva sucroenergética.
O aporte de mais recursos é necessário tanto para diminuir a concentração quanto
para enfrentar os maiores desafios de P&D sem desmobilizar os recursos físicos e
humanos envolvidos com a área.
Outro aspecto que tem relevância nas diretrizes dos fundos setoriais é a distribuição
dos recursos por regiões, inclusive com exigência legal de aporte mínimo de 30%
para as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Essa distribuição, também por
Unidades da Federação, segue, as capacidades instaladas das instituições de pesquisa
e a localização da produção canavieira. Os resultados destacam os estados das
regiões Sudeste e Nordeste (gráfico 2) como os principais beneficiários dos projetos.
A estruturação da Embrapa Agroenergia é o fator que eleva a média de valor dos
projetos do Distrito
Federal e do Centro-Oeste, conforme se nota no gráfico.
GRÁFICO 2
Número de projetos e desembolo por Unidade da Federação (1999-2012)
Desembolso
Número de projetos
121
59
24
33 34
11
9
17
9 7 4 12
12
5 6
6
1
5
3
1
0
20
40
60
80
100
120
140
0
10
20
30
40
50
60
São Paulo
Rio de Janeiro
Distrito Federal
Pernambuco
Minas Gerais
Santa Catarina
Bahia
Rio Grande do Sul
Rio Grande do Norte
Paraná
Maranhão
Paraíba
Alagoas
Mato Grosso
Mato Grosso do Sul
Ceará
Espírito Santo
Goiás
Tocantins
Piauí
Projetos (unidade)
Desembolso R$ –
INPC 31/12/2011
(Milhões)
Fonte: Base de dados MCTI.
Elaboração dos autores.
Desafios e Caminhos da Pesquisa e Inovação no Setor Sucroenergético no Brasil
|
271
Observou-se também que o apoio à pesquisa tem tido maior presença nos
projetos dos fundos Energia (CT-Energia), Agronegócios (CT-Agronegócios), Ações
em Infraestrutura e Ações Transversais. Entretanto, há projetos espalhados por outros
dez dos dezessete fundos setoriais e ações do sistema FNDCT. Destacam-se dois
aspectos:
i) desembolsos maiores para infraestruturas e subvenções; e
ii) concentra-
ção de pequenos projetos nas ações transversais, que agrupam recursos de diversos
fundos setoriais em editais específicos. As médias do desembolso por fundos e ações
encontram-se no gráfico 3, cuja base são os 379 projetos.
GRÁFICO 3
Valor médio do desembolso por fundo e ação setorial na área sucroenergética (1999-2012)
Valor médio (R$/projeto)
Número de projetos no fundo
15
28
38
14
84
26
22
36
116
379
0
50
100
150
200
250
300
350
400
0
500.000
1.000.000
1.500.000
2.000.000
2.500.000
C
T-
In
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Su
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Agro
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C
T-
Pe
tro
AC
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ra
n
sv
ers
al
Todos (m
éd
ia)
Número de projetos
Desembolso (R$ – INPC 2011)
Fonte: base de dados MCTI.
Elaboração dos autores.
O último destaque a ser feito sobre o FNDCT é o número, ainda baixo (10%)
,de interações com as firmas nos projetos analisados, considerando-se a participação
direta como intervenientes – que são as propositoras e cofinanciadoras dos projetos
em parceria oficial com pesquisadores. Entre os 379 projetos da área, cinquenta
tiveram empresas nessa condição. Entre esses, houve empresa com mais de um
projeto, resultando 36 participantes, sendo destaques a Petrobras e a Embrapa.
Apenas cinco indústrias produtoras de etanol constam da base de registro dos
projetos como intervenientes, o que pode ter ocorrido em função das parcerias feitas
fora do FNDCT, entre as indústrias, a Ridesa, o IAC, o CTC e outros. Além dos
cinquenta projetos com firmas, outros 31 tiveram como intervenientes, segundo
os registros, associações de P&D, secretarias estaduais de ciência
e tecnologia e
outras fundações de apoio à P&D.
Um resumo dos resultados nos quatorze anos analisados mostra que:
i) os recursos desembolsados para a pesquisa são de pequeno porte;
ii) os projetos
são mais representativos em número, havendo pulverização de recursos;
Quarenta Anos de Etanol em Larga Escala no Brasil: desafios, crises e perspectivas
272
|
iii) há descontinuidade no financiamento, com ausência de linhas temáticas prioritárias
e grande oscilação no montante de recursos anualmente alocados;
iv) há capacidades
instaladas em todo o país, com infraestruturas e pesquisas em quase todas
as Unidades da Federação;
v) é relativamente baixa a participação de firmas na
execução e no financiamento dos projetos na forma prevista pela legislação;
vi) os fundos setoriais são complementares a outros sistemas de financiamento à P&D e
inovação na área sucroenergética;
vii) o financiamento da P&D e inovação tem se
ampliado no FNDCT, na área sucroenergética, incluindo temas emergentes, como
insumos e processos para o etanol celulósico, OGM e novas variedades de cana.
O fato de haver muitos pequenos projetos, liderados por centenas de pesquisadores,
vários grupos de pesquisa e distintas instituições de P&D no país, também sig-
nifica potencial e oportunidade para o país na área de biomassa. Pode-se dizer que
o FNDCT, além de exercer seu papel de financiamento à P&D, expõe fragilidades
e, também, capacidades e potenciais da pesquisa em biomassa no Brasil. Diante da
perspectiva de continuidade dos usos da cana-de-açúcar para agregar maior valor
em fibras e alimentos e garantir maior aproveitamento energético, a diversidade
de capacidades pode fortalecer a P&D e a inovação nessa área.
5 O PAISS E O PROGRAMA DE P&D DA ANEEL
Conforme mencionado anteriormente, a abordagem dessas duas iniciativas de
apoio à pesquisa e inovação tem caráter preliminar por serem ambas recentes e,
por isso, sem resultados práticos. Limita-se, portanto, ao contexto sequencial ou
comparativo à trajetória do FNDCT.
5.1 O Paiss
Desafios de pesquisa e inovação levaram o governo federal a concentrar recursos
do MCTI, inclusive do FNDCT, gerenciados pela Finep, e do Fundo Tecnológico
do BNDES (Funtec) no Paiss,
15
a partir de 2012. Nyko
et al. (2013) apontam
a necessidade de tal iniciativa em razão de gargalos de alto custo e risco no
desenvolvimento de equipamentos e de variedades de cana, por exemplo.
Para
os autores, o fato de a cana-de-açúcar representar pequena parcela no mercado
global de máquinas agrícolas, sendo o Brasil o principal consumidor, leva ao
15. O Paiss Industrial, de 2011, que compõe o Programa Inova Empresa, tem as seguintes linhas: i) bioetanol de
2
a
geração (tecnologias, processos, máquinas, enzimas e micro-organismos); ii) novos produtos de cana-de-açúcar (obti-
dos da cana-de-açúcar por processos biotecnológicos, por integração e escalonamento); iii) gaseificação da biomassa
(tecnologias, equipamentos, processos e catalisadores). O Paiss Agrícola, lançado em 2012, contempla as seguintes linhas:
i) novas variedades adequadas à mecanização agrícola e maiores quantidades de biomassa/ATR, com melhoramento
transgênico; ii) máquinas e implementos para plantio e/ou colheita, com ênfase em técnicas de agricultura de precisão;
iii) sistemas integrados de manejo, planejamento e controle da produção; iv) técnicas de propagação de mudas e
dispositivos biotecnológicos de plantio; e v) adaptação de sistemas industriais para culturas energéticas compatíveis e
complementares ao sistema agroindustrial do etanol de cana-de-açúcar. O apoio contempla crédito com taxas reduzidas e
com recursos não reembolsáveis de R$ 1 milhão a R$ 10 milhões por projeto (máximo de 90% do investimento), podendo
haver mais de um projeto por firma. Prevê também subvenção, tendo como fonte recursos administrados pela Finep.
Desafios e Caminhos da Pesquisa e Inovação no Setor Sucroenergético no Brasil
|
273
desinteresse das empresas em inovação nessa área, havendo adaptações com perda
de produtividade. O desenvolvimento de uma variedade superior de cana até o
ponto de comercialização tem custo estimado de R$ 150 milhões (Niko
et al., 2013),
sendo, portanto, importante o foco de recursos nesse tipo de desafio.
Ressalta-se que, se, por um lado, a iniciativa do Paiss ataca parte do problema
da pulverização dos recursos apontados na seção anterior, por outro lado, pode
explicar em parte a queda dos recursos aportados a projetos tradicionais no FDCT
a partir de 2011. Se confirmada nos anos seguintes, essa hipótese apontaria, mais
uma vez, o baixo nível de recursos disponíveis para P&D e inovação na área de
energias renováveis no Brasil.
Na primeira etapa do Paiss, destinada a projetos da área industrial, 25 grandes
empresas tiveram planos de negócio aprovados. A demanda por recursos junto ao
programa, somadas as áreas industrial e agrícola, superou em muito a previsão
inicial de R$ 2,48 bilhões, incluídos os recursos reembolsáveis (destinados à
produção com inovação) e os não reembolsáveis (destinados ao apoio à P&D).
Esses dois tipos de desembolso conferem ao programa um perfil de inovação, um
passo além da P&D, e por isso é positivo em si. Na segunda etapa, a do Paiss Agrícola,
houve a seleção de 42 projetos, incluindo 35 de crédito reembolsável, cinco de não
reembolsável da Finep e quatro do Funtec. As contratações não estavam finalizadas
até a conclusão
deste trabalho, por isso não foram aqui abordadas.
Além da concentração dos recursos no Paiss, entretanto, não há um desenho
claro de ações e programas, por parte do governo, com a continuidade e a
previsibilidade necessárias. Também ressente-se de uma política para a economia
da biomassa, o que pressupõe medidas além de P&D, voltadas para um ou outro
uso da matéria-prima. Uma mudança na forma de apoio à inovação na área de
biomassa que ocorre com o Paiss, em relação ao apoio no formato dos fundos
setoriais/FNDCT, é a disponibilização de recursos para institutos de pesquisa
das empresas públicas e privadas, sem necessariamente haver a intermediação de
instituições públicas de P&D. Os planos de negócio orientam as escolhas dos
agentes. Essa modalidade procura efetivar estudos diretamente relacionados com
as demandas do setor produtivo, com certa independência da pauta de pesquisa da
academia. Há também o foco temático, pois foram eleitas poucas linhas, seguindo-
-se temas/gargalos de alta relevância.
O perfil dos projetos aprovados no Paiss Industrial, juntamente com as
instituições que lideram esses projetos (quadro 1),
16
ilustra bem o foco em desafios
que se tenta dar à P&D. Contudo, chama a atenção o fato de que, das empresas
16. Para mais informações sobre o Paiss, ver Plano... ([s.d.]).
Quarenta Anos de Etanol em Larga Escala no Brasil: desafios, crises e perspectivas
274
|
intervenientes nos projetos dos fundos setoriais do FNDCT, apenas três foram
selecionadas no Paiss Industrial, como se nota na última coluna do quadro 1.
QUADRO 1
Empresas com planos de negócio selecionados no Paiss agroindustrial (2011)
17
Razão Social
Linhas de
pesquisa
Tipo de agente/
rede
Origem/controle do
capital
Participação nos 344
projetos do FNDCT
Abengoa Bioenergia Agroindustrial Ltda.
I
IV
Espanha
Não
Agacê Sucroquímica Ltda.
II
NC
1
Brasil
Não
Amyris P&D Biocombustíveis
II
IV
Estados Unidos
Sim
Baraúna Comércio e Indústria Ltda.
II
III
Brasil
Não
Bioflex Agroindustrial Ltda. (GranBio)
I
V
Brasil
Não
BIOMM S/A
I
III
Brasil
Sim
Bunge Açúcar e Bioenergia Ltda.
II
IV
Holanda
Não
Butamax Biocombustíveis Avançados (Dupont/BP)
II
IV
Estados Unidos/Inglaterra
Não
Centro de Tecnologia Canavieira (CTC)
I, II
IV
Brasil
Sim
Dow Brasil
I, II
IV
Estados Unidos
Não
DSM South América Ltda.
I, II
IV
Holanda
Não
Du Pont do Brasil S/A
II
IV
Estados Unidos
Não
Eli Lilly do Brasil Ltda.
I
IV
Estados Unidos
Não
ETH Bioenergia S/A
I, II
IV, V
Brasil
Sim
Ideom Tecnologia Ltda. (Braskem)
II
IV
Brasil
Não
Kemira Chemicals Brasil Ltda.
II
IV
Finlândia
Não
LS9 Brasil Biotecnologia Ltda.
II
III
Estados Unidos
Não
Mascoma Brasil
I
III
Estados Unidos
Não
Methanum Engenharia Ambiental Ltda.
II
III
Brasil
Não
2
Metso Paper South America Ltda.
I
IV
Finlândia
Não
Novozymes Latin America Ltda.
I
IV
Dinamarca
Não
Petróleo Brasileiro S/A (Petrobras)
I, III
IV, V
Brasil
Sim
PHB Industrial S/A (Pedra/Balbo)
II
IV, V
Brasil
Não
Solazyme Brasil Óleos Renováveis e Bioprodutos Ltda.
II
IV
Estados Unidos
Não
VTT Brasil P&D Ltda.
I, II
IV
Finlândia
Não
Fonte:
Linhas editais Finep/BNDES; critérios dos autores deste trabalho, de acordo com a seção 2.2; dados deste trabalho,
a partir da base de dados do MCTI.
Notas:
1
NC = não classificada.
2
A empresa participou de outros programas de incentivo (parceria Cemig P&D).
Apesar do caráter preliminar dessa ação governamental,
a ser mais bem avaliada
no devido tempo, as informações do quadro 1 permitem fazer algumas observações
sobre a P&D e os processos de inovação na área de biomassa e em atividades da área
sucroenergética. A primeira se refere ao fato de o tema 3 (gaseificação da biomassa), que
é fortemente apoiado tanto em projetos dos fundos setoriais quanto no programa
de P&D da Aneel, ter sido contemplado em apenas um dos planos de negócio,
sendo este um dos temas de maior aposta tecnológica, estando ligado à geração
elétrica a partir da biomassa.
17. Para mais informações sobre as linhas apoiadas pelo Paiss, consultar os editais em:
.
Desafios e Caminhos da Pesquisa e Inovação no Setor Sucroenergético no Brasil
|
275
A segunda observação refere-se ao momento da pesquisa em etanol de
2
a
geração (presente em dezessete dos 25 planos de negócios) em fase de definição
de rotas dominantes e com perspectiva de rápidos negócios. Tal momento ajuda a
explicar o perfil de projetos no âmbito do Paiss. Parece haver, neste aspecto e nessa
primeira etapa do plano, a prevalência de projetos de agentes dominantes de elos
da cadeia produtiva e sua maior capacidade de compor redes de P&D voltadas para
a disponibilização de bens finais em escala comercial ou pré-comercial.
O terceiro ponto diz respeito à origem do capital das empresas apoiadas ser
predominantemente estrangeira (quinze em 25 projetos). Ressalta-se a ausência de
grupos locais importantes, principalmente na área de equipamentos. É esperado
que o país e suas empresas se incluam como agentes tecnológicos em biomassa
energética, pelo protagonismo em investimentos nessa área e pela oportunidade
de inserção internacional. Este pode ser um sinal de dificuldade nos encadeamentos
para áreas de maior conteúdo tecnológico nacional, inclusive por reflexos da
crise atual do etanol na cadeia produtiva. Há, por outro lado, outros importantes
agentes na área de insumos tecnológicos, o que é convergente com o crescimento
da cadeia produtiva.
5.2 Projetos da temática sucroenergética no programa de P&D da Aneel
O último dos instrumentos de recursos considerados neste trabalho é o programa
de P&D da Aneel. Cabe comparar brevemente o perfil relatado nos fundos setoriais
com o perfil dos projetos na área de energias renováveis e da subárea produtiva
sucroenergética aprovados no âmbito do programa. Embora recente e com uma
série de propostas que não seriam definidas como P&D na forma do Manual de
Frascati (Pompermayer, De Negri e Cavalcante, 2011),
em seus primeiros anos, a
leitura das descritivas dos projetos detecta avanços em anos recentes nesse sentido,
inclusive quando comparado com projetos dos fundos setoriais.
Como a base de dados disponível para este trabalho foi restrita às informações
agregadas, apenas parte das variáveis foi analisada, atendendo apenas ao intuito
de identificar a existência de projetos de ERs e da área sucroenergética no Progra-
ma Aneel de Apoio à P&D. A partir da análise dos descritores de 2.137 projetos
cadastrados entre 2008 e 2011 na base, aplicou-se a mesma metodologia utilizada
para a seleção dos projetos da área dentro dos fundos setoriais.
Foram selecionados 245 projetos da área de energias renováveis dentro do
programa, com um valor total de R$ 1,59 bilhão (tabela 5), a valores de 2011
(INPC), lembrando que os dados efetivados não se encontravam disponíveis
quando da coleta. A título de comparação, o FNDCT contratou 1.893 projetos,
prevendo R$ 1,23 bilhão, tendo desembolsado R$ 809 milhões em quatorze anos
para as ERs. Entre os 245 projetos de ERs, verificou-se, entretanto, que apenas nove
Quarenta Anos de Etanol em Larga Escala no Brasil: desafios, crises e perspectivas
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abrangem temas da cadeia sucroenergética. Nesses nove projetos, tanto a soma do
custo total previsto, de R$ 48,172 milhões, quanto a média desse custo (R$ 5,363
milhões/projeto) são bastante relevantes, inclusive pelo porte superior em quase
treze vezes a média contratada pelos 344 detectados no FNDCT.
TABELA 5
Valores de custo e número de projetos no programa de P&D da Aneel – todas as ERs
e sucroenergética
Ano
Projetos em energias renováveis
Projetos da área sucroenergética
Número
Custo informado
(R$ INPC 2011)
Número
Custo informado
(R$ INPC 2011)
2008
3
26.213.856
2009
25
87.857.029
1
23.276.902
2010
59
126.672.812
1
2.303.885
2011
56
499.341.153
4
7.673.984
2012
71
620.487.283
2
8.586.926
2013
31
236.300.012
1
6.430.723
Todos
245
1.596.872.144
9
48.272.420
Fonte: Aneel.
18
Elaboração dos autores.
Aprofundamentos sobre o objeto de cada pesquisa dos projetos, bem como
dos resultados colhidos, entre outras questões, são aspectos importantes no acom-
panhamento do programa e em estudos posteriores. Tecnicamente, essa fonte de
recursos pode ser ampliada no tocante à geração de energia elétrica de biomassa
em geral, inclusive no desenvolvimento de matéria-prima, processos industriais e
elos com linhas de transmissão.
Diferentemente do que ocorre
nos fundos setoriais do MCTI, observa-se,
neste caso, que há recursos consideráveis disponíveis no programa. Tais recursos
podem ser estratégicos para a atividade sucroenergética e para outras ERs, apesar
da baixa alocação atual na primeira. Pode-se, por exemplo, por meio do Programa
Aneel:
i) dar foco à etapa industrial, em equipamentos e temas ligados à geração
elétrica (inclusive desenvolvimento do rendimento agronômico da biomassa, do
processo de queima/pirólise, da eficiência na transformação da energia e em sistemas
de conexão com outas fontes);
ii) fomentar o desenvolvimento da cana energia
(maior teor de fibras do que açúcares) e modelagens de sistemas agroindustriais para
a sua produção e uso;
iii) investir na P&D e inovação em gargalos das interfaces
entre biomassa energética/reforma do hidrogênio ou veículos híbridos a
etanol/energia elétrica.
18. A lista de projetos do Programa de P&D Aneel está disponível para consulta em:
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